domingo, 30 de outubro de 2016

Seu Sabá do Cinema

 O jovem Sebastião Guimarães, revisando a película.
Foto: Chico Carneiro.

Publicado originalmente no blog Memórias do Cine Argus, em 17 de outubro de 2015.

Seu Sabá do Cinema.
Por Edivaldo Moura.

"Olha o roubo! Olha o roubo!" Quem nunca ouviu esses gritos no Cine Argus, quando cenas de ação sofriam saltos durante a projeção (muitas vezes nos momentos de maior tensão)? Quem senta em um poltrona de cinema não percebe o trabalho de preparação que existe antes da projeção do filme. No caso dos cinemas que ainda não aderiram à projeção digital, esse trabalho envolve a manipulação da película, material fotográfico de diversas bitolas utilizado para a gravação e projeção de filmes. Em se tratando dos cinemas de rua do interior, os rolos de películas dos longa metragens chegavam muitas vezes cheios riscos e remendas, em função de já terem circulado em diversos outros cinemas. E aí entrava o trabalho minucioso de fazer os reparos nos filmes antes das exibições, o que normalmente era feito pelo projecionista, que também cuidava da manutenção dos equipamentos.

Um dos mais importantes projecionistas do Cine Argus é Sebastião Guimarães, conhecido até hoje como Sabá do Cinema. Sebastião (ou Sabá) me recebeu em sua residência meio que de surpresa. Eu estava procurando o mesmo, após receber uma dica de sua localização no bairro da Cohab, em Castanhal, e felizmente o encontrei. Embora com certa timidez, Sabá foi se entusiasmando em falar do trabalho de décadas no cinema de Seu Duca, da dura jornada de trabalho nos dias de sexta-feira santa com as sessões do filme A Vida de Cristo, da generosidade do patrão, dos tempos de uma Castanhal sem violência (onde se podia trabalhar até tarde e depois caminhar a pé até sua casa sem ser oportunado) e, é claro, do trabalho igualmente recompensante e ingrato do projecionista.

"Eu gostava de trabalhar no Cine Argus por que eu via muita gente dentro do cinema. Era (os filmes) A Vida de Cristo, Rambo, Tarzan...", relembra com saudade. A alegria das pessoas o recompensava. Mas, a profissão também tinha o lado ingrato. Sabá sofria com os filmes que chegavam muito deteriorados ao Cine Argus e que consumia horas de trabalho minucioso para remendar. Era impossível evitar a perda de fotogramas. Às vezes, não obstante toda a dedicação, o filme quebrava. E as vaias comiam. "Tu é doido é, a gente só faltava apanhar!", exagera.

Décadas de dedicação na projeção dos filmes lhe renderam problemas de vista. Marcas cruéis de um tempo saudoso, de uma heróica testemunha ativa da saga de Seu Duca. O problema de visão lhe impediu de ir assistir ao filme Memórias do Cine Argus nas duas vezes em que foi exibido na Fundação Cultural de Castanhal. Mas não o impediu de o assistir em sua casa. E de fazer uma justa observação: "O filme contou só uma parte da história. Vixi, o Cine Argus foi muito mais que aquilo!". Nós sabemos, Sabá. E é por isso que nossa pesquisa continua.

Texto e imagem reproduzidos do blog: memoriasdocineargus.blogspot.com.br

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