Colecionador de artigos raros de cinema e amor pelo Tarzan.
“Cine João”
Publicado originalmente no site Cineset, em 22 de setembro de 2017.
Projecionista dos cinemas do centro de Manaus, será tema de documentário
Por Caio Pimenta
“A melhor coisa do mundo foi o cinema”.
Projecionista dos cinemas históricos do Centro de Manaus,
seu João Cordeiro, de 70 anos, define assim a importância da Sétima Arte para a
vida dele. Após exibir centenas de filmes durante a carreira, agora, ele será
tema de um filme. A obra será dirigida por Anderson Mendes, mesmo realizador
dos documentários “A Incrível História de Coti: O Rambo do São Jorge”, “Picolé
do Aranha” e “Oscarino e Peteleco”.
A relação de João Cordeiro com o cinema começou cedo: aos 10
anos de idade, ele foi com os irmãos no Cine Éden assistir à comédia espanhola
“Marcelino Pão e Vinho”, dirigida por Ladislao Vajda em 1955. Dali em diante, o
jovem estudante começou a frequentar todos as salas de exibição da cidade
existentes nos anos 1950: Polytheama,
Ypiranga, Vitória, Ideal. “Nesta época, eu ia escondido. De tanto que
frequentava, minha mãe chegava a mandar alguém me procurar lá. Os porteiros
também me conheciam”, disse.
O favorito, entretanto, era o Cine Guarany, onde trabalhou
como projecionista pela primeira vez: aos 15 anos de idade na sessão do
faroeste “Cinco Revólveres Mercenários”, de Roger Corman. “Nunca mais vai
conseguir ter um outro cinema do tipo do Guarany em Manaus. Aprendi tudo lá”,
afirmou. Para ter acesso às áreas de projeção, ele fazia amizade com os profissionais
da área.
A paixão pelo cinema era tanta que João seguiu na carreira
trabalhando no Guarany, no Popular e nos cinemas geridos pelo empresário e
agitador cultural, Joaquim Marinho, como, por exemplo, Grande Otelo, Renato
Aragão, Chaplin e, especialmente, o Oscarito, onde foi o projecionista por sete
anos. O último local que atuou na profissão foi no início do Severiano Ribeiro,
nos anos 1990, no Amazonas Shopping.
Para ele, o cinema foi a grande diversão de uma geração em
Manaus até mesmo que o futebol. “Quando dava 12h, eu já estava lá para esperar
ver os filmes do Tarzan, faroestes, épicos. Todo o domingo tinha as sessões dos
seriados que a gente esperava. Na época em que eu trabalhava lá, não tinha
vontade de sair: almoçava, jantava, tudo lá. Se pudesse, moraria no cinema”.
Quem acha que o amor pelo cinema se restringiu a projetar
filmes nas salas locais se engana. João Cordeiro possui um acervo com mais de 5
mil DVDs de filmes antigos. A coleção conta com todos as produções estreladas
por Roberto Carlos, Beatles, faroestes de Durango Kid, épicos como El Cid,
clássicos B da ficção científica, episódios históricos do seriado da
Mulher-Maravilha estrelados por Lynda Carter, além de pôsteres, gibis antigos,
livros, fotos raras de Manaus e projetores antigos ainda em funcionamento.
O destaque da coleção fica por conta dos filmes do Tarzan,
personagem favorito de Seu João. “Ele era o nosso herói, ídolo da garotada
daquela época. Tudo porque ele salvava todo mundo. Tanto é que quando chegava
em casa, eu amarrava uma corda no pé de jenipapo e imitava o que vi nas telas”,
declarou. Com isso, o projecionista criou verdadeira adoração pelo ator Johnny
Weissmuller, intérprete clássico do Tarzan, e teve como primeira musa Brenda
Joyce, a Jane.
Para os interessados neste rico acervo de filmes clássicos e
obras raras, a notícia legal é que Seu João Cordeiro faz cópias para os
interessados. O material é disponibilizado em DVD com capinha colorida em boa
qualidade. O preço é negociável e tudo fica pronto no dia seguinte à
solicitação. Os pedidos podem ser feitos pelos números: (92) 9176-6414 /
9306-9616.
Hoje em dia, seu João Cordeiro já não se interessa mais em
ir ao cinema. “Prefiro ficar em casa. Meu cinema é este aqui. Meus filhos até
me chamam, mas, prefiro ficar com os meus mesmos. De vez em quando, coloco o
projetor e exibo”, afirmou.
O documentário sobre seu João começou a ser feito por
Anderson Mendes em agosto deste ano no mesmo período em que finalizava
“Oscarino e Peteleco”. O diretor conta que conheceu João Cordeiro através do
amigo Valter Frota, mesma pessoa que o apresentou ao Ney Valente, o
protagonista do documentário “Picolé do Aranha”. “O seu João começou a me
contar a história dele e daí consegui espaço na agenda durante as minhas férias
para fazer o filme.
A segunda parte das filmagens estão previstas para serem
realizadas em outubro. Além de gravações em estúdio e na própria casa de Seu
João, haverá também tomadas em frente aos antigos cinemas do centro.
Com duração prevista de 15 minutos, o filme será composto
destas entrevistas retratando desde a infância até os dias atuais de Seu João
mesclando com imagens dos filmes preferidos e mais marcantes da vida dele como
“Marcelino Pão e Vinho” e as aventuras do Tarzan. “Uma das histórias mais
legais que vamos ter a do mudo que voltou a falar durante uma sessão de
cinema”, afirmou o diretor.
Anderson Mendes traz uma carreira marcada por documentários
sobre pessoas peculiares de Manaus e com algum tipo de ligação com as artes.
Foi assim ao retratar um homem que fazia filmes amadores de ação e era
conhecido por ser o Rambo do bairro São Jorge em Manaus e o vendedor de picolés
que se veste de Homem-Aranha na Cidade Nova, isso para não falar da dupla
Oscarino & Peteleco, ícones culturais de Manaus. Seu João Cordeiro é mais
um representante desta tradição para a filmografia do documentarista.
“Ele (João Cordeiro) dialoga forte com o Rambo e o
Pistolino. O primeiro pelo sonho em fazer cinema, enquanto o segundo pela
persistência em fazer filme. Já o seu João tem esta dedicação na exibição dos
cinemas no centro de Manaus. Acredito que a palavra-chave deste novo projeto é
a resistência. O sonho dele é uma retomada do cinema na área central da
cidade”, afirmou.
Projeto 100% independente, “Cine João” conta com fotografia
de Bruno Pereira e produção de Valter Frota. O lançamento está previsto para o
fim deste ano.
Texto e imagens reproduzidos do site: cineset.com.br
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