O fim da película, o fim do cinema?
Por Henrique Borralho.
O pedido de concordata da Kodak e a venda dos negócios de
películas fotográficas e de filmes no ano passado abre uma discussão sobre o
conceito clássico de cinema. Com a entrada e produção de filmes digitais,
gravados e documentados em HD, o mercado de películas se apequenou, perdeu
espaço, continuou a ser custoso e mudou a concepção tradicional de cinema.
Desde este invento pelos irmãos Lumière, passando Chaplin,
Cinema Russo, Alemão, Orson Welles, a criação da poderosa indústria de
Hollywood, até o debate na Escola de Frankfurt acerca da reprodutibilidade
técnica produzida pela cinema, esta arte-magia sempre se caracterizou pela
reprodução de imagens em película, uma câmara escura, um projetor, uma sala,
público.
Muita coisa mudou desde a invenção dessa técnica. Monopólios
de distribuição e produção de filmes, a criação de uma mais maiores indústria
do mundo, isso mesmo, cinema virou indústria, passando por modificações
técnicas, afetando e sendo afetada por novos meneios de modernismos, a
sensibilidade humana foi profundamente atingida.
Obrigou inclusive a se repensar o conceito de arte, já que é
síntese a mistura/fusão das outras 6 artes. O cinema é tridimensionalidade, é
movimento, é expansão, perspectiva, plano de fundo. Usando Marshall Berman como
argumento, a arte é ao mesmo tempo receptora/promotora das novas sensibilidades
humanas, sendo assim, nos fez sonhar ao mesmo tempo que captou os nossos
desejos mais visionários.
O problema é a velha questão da tecnologia como caudatária
da reprodução do capital. A promoção do cinema enquanto indústria, além de
gerar bilhões de dólares, obrigou estúdios, produtores, cineastas, congêneres,
a buscarem novas formas de confecção/distribuição de olho no mercado
consumidor. Paralelamente a isso apareceu o fenômeno internet/digital,
possibilitando as reduções de custo de produção e o surgimento de indústrias
como a Bollywood, da Índia, a Nollywood, da Nigéria, quebrando o monopólio
estadunidense.
Como toda transformação, toda mudança produz significativas
alterações de rota, o fenômeno digital mudou por conseguinte a própria concepção
de cinema para vídeo. Pessoas nas suas próprias casas, com parcos recursos e
algum conhecimento de técnica fílmica linguagem/programa de computador,
passaram a fazer filmes e exibi-los na rede mundial. Há vários sucessos e
exemplos, inclusive de bilheteria (As bruxas de Blair são um deles).
Para atrair o público que deixou lentamente de frequentar as
salas de cinema, a indústria cinematográfica teve que se reinventar, adaptar-se
às mudanças, que no fundo são do capital. Passaram a filmar remakes, fazer filmes
retrôs, filmar quadrinhos, usar recursos tecnológicos para prender a atenção do
público. O cinema deslindou-se cada vez mais para espetáculo, para o
entertainment. O caso da mini-serie LOST é emblemático: foi a primeira vez que
cinema/televisão, internet, pesquisa de opinião foram utilizados na
produção/confecção e forma de conceberem uma série. Os produtores acompanhavam
passo a passo a recepção do público para conduzirem os capítulos, além de usarem de mensagens subliminares
levando o público a decifrarem quase em tempo real o que iria acontecer nos
episódios seguintes.
A sedução dos filmes 3D (três dimensões) sinalizava que a
morte da película era mais que anunciada. Só para se ter uma ideia, Avatar só
pode ser filmado quando enfim surgiu uma tecnologia compatível, possível para a
megalomania do projeto. A mesma coisa aconteceu com a saga Star Wars. Georges
Lucas filmou detrás para frente, ou seja, começou sem explicar como tudo havia
começado pelo simples fato de que quando havia idealizado não existia
tecnologia suficiente para os efeitos que desejara.
O mundo é dinâmico, é fato. A mesma discussão surgiu quando
do surgimento da fotografia, do próprio cinema, da televisão, do disco vinil,
do Cd, da fita cassete, do VHS, do Cd, dvd, do Blue ray, dos filmes 3D, agora
4D e da polêmica sobre o futuro das películas.
Talvez a questão seja meramente conceitual, ou seja, cinema
passará a ser produção de vídeo, afinal, com a invenção das câmeras
fotográficas digitais, o mercado de películas para fotografia praticamente
desapareceu, no entanto, a fotografia deixou de existir?
O fim da película representa o fim do cinema? Com certeza
não, mas um tipo de cinema fatalmente vai desaparecer para dar lugar a
outro.
Texto reproduzido do blog: versura.blogspot.com.br
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