Fotos: Milena Schafer.
Publicado originalmente pelo Blog Arte é Tri, em 16/11/2013.
O cinema e a arte de projetar
Por Milena Schäfer.
Há mais de 18 anos, Rudimar Balbinot é projetista do Cine
Ideale, cinema independente localizado em Carlos Barbosa. A atividade, passada
de pai para filho, é executada como hobby, mas exige comprometimento,
responsabilidade e, acima de tudo, paixão incondicional pela sétima arte
Uma sala de cinema vai muito além da mera exibição de um
filme. Durante aproximadamente duas horas – às vezes menos, às vezes mais – o
espaço se torna palco de grandes emoções transmitidas pelas imagens do filme.
Cenas de amor, suspense e ação contagiam o público, provocando risos e lágrimas
com cheiro de pipoca.
Por trás de tudo isso, em uma salinha de poucos metros
quadrados, um rolo gira e, iluminado pelo projetor, torna possível que todas
essas emoções sejam transmitidas, sejam sentidas por quem trocou a novela, o
jogo, e até mesmo os estudos, pelo cinema.
Das cerca de 150 pessoas que podem lotar a única sala do
Cine Ideale, poucas – quem sabe duas ou três – percebem a presença dele, atrás
de uma janelinha iluminada, em uma espécie de mezanino: o projetista, Rudimar
Balbinot. Aos 44 anos de idade, o barbosense se dedica, há quase duas décadas,
ao ofício que aprendeu com seu pai, Darci Balbinot, hoje com 73 anos.
Darci começou a projetar filmes ainda nas décadas de 1960 e
1970, em um cinema que funcionava no Salão Paroquial da Igreja Matriz de Carlos
Barbosa, administrado por Celso Dolzan, hoje com 81 anos. Com a extinção da
sala, e inauguração do Cine Ideale, em 1992, Darci voltou a projetar, contando
em seguida com a ajuda de seu filho.
“Perdemos muitos
compromissos, casamentos e aniversários, para projetar filmes no cinema”,
lembra Rudimar, que calcula ter assistido aproximadamente 600 filmes ao longo
de sua trajetória no Cine Ideale. “É uma vida para quem é casado, e não tem
muitos compromissos, faço por hobby mesmo”, completa o projetista, que tem
outras atividades profissionais e recebe apenas um valor simbólico para
projetar filmes no cinema de Carlos Barbosa.
Com o passar dos anos, Darci acabou passando para o filho a
tarefa. “Ele ainda vem algumas vezes, mas a maior parte fica comigo”, explica
Rudimar. O Cine Ideale exibe um filme por semana, com um total de cinco
sessões, somente à noite, com exceção de alguns filmes (geralmente os de
público infantil, que ganham matinês extras).
A projeção hoje é realizada com um equipamento elétrico, de
segunda geração. “O primeiro era movido à carvão”, afirma Rudimar, que gosta do
que faz e a esse sentimento atribui a responsabilidade e comprometimento que
dedica para tal atividade. “O Cine Ideale nunca deixou de ter exibição por
falta de projetista. Meu pai e eu faltamos apenas no dia do meu casamento, e
conseguimos um substituto para aquela noite”, relembra ele. Atualmente um rapaz
está sendo capacitado para também projetar os filmes na sala de cinema
barbosense.
Sobre o Cine Ideale.
Em atividade desde
1992, o Cine Ideale é a única sala de cinema em Carlos Barbosa, que também
recebe público de cidades da região como Garibaldi, Barão e São Vendelino.
Administrado pela Associação de Cinema, Cultura e Arte (ACCARTE), o Idelae é um
dos poucos “cinemas de rua” que ainda sobrevive em meio às redes
cinematográficas instaladas em shoppings e grandes centros.
A sala funciona no prédio da antiga estação férrea, que
ainda é preservado pelo Poder Público como patrimônio histórico. Além de
promover a sétima arte para os moradores da cidade e arredores, a ACCARTE
também apoia outras atividades de cunho cultural e de interesse social, como
shows, teatros, palestras e debates.
A barbosense Maria Cristina Chies, que fez parte do primeiro
grupo da associação do cinema, ressalta o princípio de atuação da ACCARTE na
cidade. “Nunca tivemos compromisso com uma distribuidora e, além do mais, não
objetivávamos lucro, apenas arrecadação suficiente para mantermos o cinema”,
afirma ela, lembrando de muitos títulos que foram exibidos somente em Carlos
Barbosa, enquanto outros cinemas adotavam apenas filmes lucrativos, que rendiam
bilheteria, deixando os interesses culturais em segundo plano.
21 anos depois, o Cine Ideale mantém a mesma premissa: levar
cultura à comuinidade, sem fins lucrativos. Presidida atualmente por Crisitano
Piacentini, a associação conta com aproximadamente 10 sócios, que contribuem
com uma mensalidade e também com trabalho voluntário (cuidando das sessões
durante a semana).
As sessões ocorrem cinco vezes por semana, por um valor
relativamente baixo se comparado ao preço pago em outros cinemas. Com o valor
arrecadado, a associação cobre o valor do filme e despesas com a manutenção e
administração da sede, visando ainda uma reforma no local. “Estamos buscando
recursos federais para executar um projeto de reforma que inclusive já temos no
papel”, conta Piacentini, com a ideia de que o “cinema de rua” de Carlos
Barbosa perdure por muitos anos.
Texto e fotos reproduzidos do blog: arteetri.wordpress.com
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