Projecionista conferindo chegada de filme completo,
dividido por partes, em rolos e dentro de latas. (Foto de Carlo Cerchioli).
Imagem postada por MD, para simples ilustração de artigo.
Publicado originalmente no site GCN, em 10/06/2009.
Bastidores do cinema
Por Fernanda Martins.
Pegar um cineminha no fim de semana, acompanhado ou até
mesmo sozinho, é uma prática comum em Franca. O que muita gente não imagina é
que a projeção dos filmes na telona não é tão simples como alugar um filme e
assistir no aparelho DVD em casa. A cada sessão, enquanto os cinéfilos compram
ingressos, pipocas e guloseimas, o projecionista está a mil por hora nos
corredores que ligam as três salas da Moviecom, instaladas no Franca Shopping.
Desde 28 de dezembro de 1895, em Paris, quando os irmãos Lumière fizeram uma
apresentação pública do cinematógrafo, a sétima arte caiu no gosto popular, mas
pouca coisa mudou desde a invenção do cinema. Quem pensa que o filme é igual ao
DVD está enganado. Transportadas divididas em latas (que pesam em média 2
quilos cada), as películas enroladas são cuidadosamente manuseadas pelo
projecionista José Viumar da Silva, de 35 anos.
O trabalho dele começa quando
os filmes chegam, às vezes horas antes da estreia, na sexta-feira. Na máquina
de montagem José Viumar emenda os trailers e filmes - feitos em películas de 35
mm, com imagens dispostas em frames (ou fotogramas) - em fita especial que
resiste ao calor do projetor. "Cada 40 frames equivalem a um segundo de
imagem. A linha azul à margem da película é o som, por isso tenho que prestar
bastante atenção na hora de montar para não trocar os lados", ressalta
Viumar. O primeiro filme com som totalmente sincronizado foi lançado em 1928:
The Lights of New York, da Warner. Recentemente, o Cine 1 recebeu um sistema de
som digital de última geração. Em seguida, o filme (montado num prato) vai para
a máquina de automação composta por três pratos. Através das roldanas, ele
passa pelo projetor e retorna a outro prato, ficando pronto para a próxima
sessão. José Viumar faz questão de ressaltar que a máquina de projeção tem uma
lâmpada Xenon poderosa. "Essa luz é tão forte, que se olhar diretamente
nela a gente pode ficar cego", orienta. As lentes também são trocadas.
"Os filmes podem ser em plano ou scope (tela cheia). Para projetar de
acordo com a filmagem, utilizo uma lente própria para cada tipo", explica.
Com a ajuda de auxiliar, José Viumar dá conta do recado e ainda arruma tempo
para uma espiadinha, num lugar privilegiado: uma cadeira com almofada ao lado
de cada janela.
A gerente da Moviecom de Franca,
Michela de Oliveira, argumenta que para atender ao anseio dos cinéfilos
brasileiros em ver os filmes recém-lançados, as distribuidoras fazem rodízio
dos longas entre as praças. "São mais de 1.900 salas de cinema no País e
infelizmente as produtoras liberam poucas cópias. Por isso, nem sempre os
longas estreiam simultaneamente na capital e em Franca", rebate, alegando
que também são as distribuidoras que escolhem as salas que vão receber os
filmes legendados ou dublados. Por causa desta rotatividade, o trabalho de José
Viumar é sempre dobrado. Depois de fazer o processo para "emendar" os
filmes, quando eles saem de cartaz, o projecionista precisa desmontar tudo de
novo, encaixotar e mandar para outra praça. Simples. Nem tanto quando o
projecionista anterior não é cuidadoso e inverte as partes dos filmes, trocando
as caixas. "Às vezes os filmes chegam, por exemplo, em 10 partes e na lata
quatro vem a parte oito. Por isso, depois que emendo preciso assistir e conferir.
Dá trabalho porque é a primeira vez que vou ver o filme e preciso perceber se
ele está na sequência. Assim, preciso revisar o trabalho para ver se a
qualidade de imagem e som ficou boa", conta. Outro problema que José
Viumar enfrenta, é que como os filmes vêm de outras praças em avião ou ônibus,
geralmente chegam um dia antes da estreia ou até mesmo na manhã de sexta-feira,
em cima da hora. Com certeza alguém que está lendo esta matéria já passou raiva
no cinema um dia quando o filme parou de rodar de repente. José Viumar explica
que isso acontece quando falta energia ou quando a fita arrebenta. "Nesse
caso, infelizmente preciso cortar a fita, mas cinco metros equivalem a apenas
seis segundos de filme, então o corte fica imperceptível", revela.
Pelo
trabalho de projecionista José Viumar recebe dois salários, com uma carga
horária de seis horas diárias. O cearense se diverte no interior das salas de
projeções e tem muitas histórias para contar. "Um dia durante a sessão
flagrei um casal no maior `rala-e-rola`. Então chamei os funcionários e abrimos
a janela (da projeção). Aí eles perceberam", lembra. José Viumar recorda
que aprendeu a profissão aos 22 anos com Renan Gomes, projecionista dos antigos
cinemas francanos São Luis, Odeon e Bristol. O primeiro filme que ele montou
foi A Rocha (1996), de Michael Bay. Um filme que marcou o projecionista foi
Titanic, que ficou quase três meses em cartaz no cinema. Faltaram exatamente
"quatro dias para completar três meses", segundo Viumar. "Foi um
sucesso de bilheteria. Até hoje eu não vi um público maior. As filas não
acabavam", recorda. Mas o que chama mais atenção dele são os desenhos. A
expectativa agora é para a estreia de A Era do Gelo 3, prevista para 1º de
julho. Há 12 anos trabalhando no cinema do Franca Shopping, recentemente ele
foi visitar os parentes no Ceará, mas não via a hora de voltar. "Acostumei
com a sala, nem escuto o barulho (do filme rodando entre o prato e o projetor).
Moro no cinema e adoro", conclui.
Texto reproduzido do site: gcn.net.br/noticias
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