Projetores: analógico e digital, na cabine de projeção.
Imagem reproduzida do Google e postada por "Máquina de Cinema,
para ilustrar o presente artigo.
Publicado originalmente no Hollywoodiano, em 19 de novembro de 2015.
Analógico vs. Digital.
Por Otávio Almeida.
Crônica de um cinéfilo carioca sobre o saudosismo da
projeção analógica e a realidade do digital
Sei que cheguei ao futuro quando me dou conta de que vim da
época em que o cinema contava somente com projeção analógica. Deve ter sido a
mesma sensação de meus pais e avós, que eram do tempo de outras invenções, como
a máquina de escrever, o telefone com fio, chuveiro a gás, a televisão de tubo
e a carta escrita à mão.
Para funcionar como se espera, pelo menos no Brasil, a
mudança do analógico para o digital precisa superar o tópico da nostalgia.
Vamos voltar um pouco: se os multiplexes não estivessem no mercado,
provavelmente o passatempo (ou o vício) de ir ao cinema teria desaparecido ou
diminuído drasticamente há 15 ou 20 anos. E ir aos cinemas de rua na
proximidade da virada do século não era mais um programa seguro para famílias,
afinal assaltos se tornaram frequentes e a manutenção das salas andava relaxada
demais. É o que acontece com quem não evolui.
Mas presenciei essa mudança com muita dor no coração, porque
cresci no bairro da Tijuca, no Rio de Janeiro, onde diversos cinemas se
espalhavam pelas calçadas, com filas desconfortáveis se espremendo entre outras
pessoas com muita pressa, que tinham objetivos diferentes de quem naquele
instante se preparava para assistir a um filme já sentindo o cheiro de pipoca
que vinha lá de dentro.
Viu? Nostalgia pode ser algo bom, mas ela entra em você de
um jeito que não solta mais. Ela ameaça dominar nossas ações e tenta impedir
que a gente siga em frente, deixando eu e você presos no passado, como a
película fotográfica das salas que representavam a “Segunda Cinelândia
Carioca”. Comparada às definições de hoje – padrão nos lugares mais
desenvolvidos do mundo -, os filmes desse sistema ultrapassado, que ainda
resiste no Brasil, oferecem uma imagem suja, sem cor ou brilho. Até mesmo
arranhada. Isso porque os cinemas recebiam cópias da cópia e os projecionistas
eram obrigados a tocar nos filmes, além de cortar e emendar rolos. Sua
existência representa pura nostalgia, preguiça ou desejo de não gastar com
equipamentos e reformas nas salas de cinema. É verdade que tudo tem um custo,
mas o melhor resultado vem em longo prazo.
Pena, no entanto, que empregos como os dos projecionistas
estejam em risco. Mas se não pensarmos adiante, ficaremos para trás como
cinemas que marcaram a história do Rio, e permanecem extintos, como o América e
o Carioca, onde vi filmes “antigos”, e no velho formato, como Jurassic Park,
Dança com Lobos, Duro de Matar 2, De Volta Para o Futuro I, II e III. Era o que
tinha para a época, mas imagine se esses filmes tivessem sido criados para
exibições digitais, a exemplo do que fazem hoje cineastas como James Cameron,
em Avatar, e Peter Jackson, em O Hobbit.
A tecnologia está em toda parte, embora a gente nem perceba
sua presença. Hoje, ela é notada quando falha ou quando não está disponível em
determinado lugar. Isso para afirmar que o público deste século não assistiria
a Star Wars ou Jogos Vorazes com qualidades de imagem e som inferiores ao
padrão atual. Quem viu As Aventuras de Pi e A Invenção de Hugo Cabret,
certamente não vai chorar pela projeção analógica. E se Quentin Tarantino
defende a película até a morte, temos um cineasta muito mais velho como Martin
Scorsese estudando e apoiando cada vez mais o digital.
A respeito das salas de cinema, as cópias digitais são mais
baratas e oferecem resoluções próximas à perfeição. Não exigem outras cópias, o
que gera uma baita economia. Além disso, os distribuidores reduzem custo com o
fim do transporte dos rolos de filme. Em breve, todas as salas serão capazes de
projetar qualquer mídia digital, incluindo a possibilidade de transmissão
simultânea ou ao vivo. O esforço é apertar play e deixar o computador
trabalhar. É um desafio e tanto para líderes de estúdios, distribuidoras e
exibidores, mas o digital provoca mudanças na vida e em todos os setores.
É uma evolução que chegou às indústrias da música e dos
games, e são poucos os que ainda pedem discos de vinil ou jogos de Atari.
Também aceitamos a mudança do modo como vemos filmes em casa. Alguém ainda vai
à locadora do bairro? O streaming veio para ficar e aposto que você tem
preguiça de vez em quando na hora de pegar não o DVD, mas seu Blu-ray da
estante, ou do armário, tirar a poeira da caixa, abri-la, pegar o disco,
apertar eject no Blu-ray Player, esperar alguns segundos até o conteúdo ser
carregado e dar início às propagandas e trailers. Quando o filme começa mesmo?
Ainda nem chegamos ao menu principal.
O ponto é que não devemos parar no tempo. Entenda que o
futuro vai virar passado e tudo isso que falamos aqui terá cheiro de mofo. Mas
e quanto a você?
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