Texto publicado originalmente no site Cine Potiguar, em 18/07/2011
Gazeta do Oeste: relíquias do cinema potiguar
Colecionador fala sobre relíquias do cinema
Geraldo Pires adquiriu parte do acervo do Cine Pax; entre as
raridades, um projetor a carvão, além de cartazes e filmes
Por Mário Gerson (Da Redação)
Atendendo por trás de um balcão a fregueses diversos, o homem
de óculos e olhar sereno não tem o mesmo ar quando entra no pequeno
compartimento de uma casa, localizada ao lado do comércio da família. Lá,
Geraldo Pires se transforma. É outra pessoa quando começa a falar sobre os
projetores raros que coleciona, os rolos de 16 e 35 milímetros, filmes que não
estão mais disponíveis no mercado, além de uma grande coleção de cartazes de
cinema – são quase 300 – todos eles pertenciam ao antigo Cine Pax, fechado há
alguns anos na cidade. “Tenho o cartaz do primeiro filme exibido no Pax, em
1943: Formosa Bandida! Luiz Pinto doou para minha coleção”, salienta, enquanto
pega um rolo de filme, dos quase 100 rolos antigos de sua coleção. “Todo mês
tenho que limpá-los. Uma vez perdi muitos deles. Para mantê-los perfeitos, exige-se
atenção. Senão, o clima, o tempo, tudo pode danificá-los”, explica. “Além
deles, tenho 4.186 filmes em VHS”, diz, sorrindo.
O andar lento, a forma como fala da coleção, tudo isso
desperta atenção quando o visitante entra na sala reservada para o acervo. Uma
de suas peças mais raras é o projetor a carvão, que pertenceu ao Cine Imperial
– e logo depois ao Pax – adquirido pelo valor de R$ 4.600,00. “30% do que
ganho, no comércio da família, é destinado para o meu hobby, filmes, películas
antigas, filmadoras raras e projetores”, diz, ao mostrar a coleção nas estantes
de aço.
Na entrada da casa, a primeira peça é o projetor do Cine
Imperial. “São dois homens ou mais para transportá-lo e naqueles carrinhos! Ele
pesa muito”, destaca. Em aço fundido, a peça é uma raridade que ele está
“ajeitando aos poucos”, para depois ser utilizada num projeto ousado do
comerciante.
Há outros projetores raros. Um deles é o de 16 milímetros,
de fabricação australiana. “Este é uma joia rara. É um projetor mudo”, fala,
com alegria. “Tenho amigos que também gostam de cinema, assim como eu, e
colecionam. Posso citar um grande conhecedor do assunto e que tem um importante
acervo, nesse sentido: Carlos Frederico. Mora em Natal e conhece bem a área”,
destaca.
Entre outras peças do acervo, as que merecem também destaque
são os rolos com filmes em 35 e 16 milímetros, além das filmadoras. “Tenho uma
filmadora – infelizmente está em Fortaleza – que funciona à corda. Dávamos
corda e depois filmávamos. Esta outra, manual, que utilizei também até a década
de 70, só filma três minutos. Fiz alguns documentários com ela. É a Rollei,
Super 8, à pilha”, diz.
No entanto, é do projetor Natco – 1945 – americano –
pós-Segunda Guerra Mundial, de quem fala com certo orgulho. “Ganhei de um
amigo, sob a condição de nunca me desfazer dele. Muitas pessoas já ‘colocaram
dinheiro’ no Natco, que veio para o Brasil trazido por um libanês. Ele fugia da
Segunda Guerra. Foi para os Estados Unidos, mas descobriu que o Brasil lhe dava
mais condições de melhor moradia e calma. Hoje, ele está comigo e já neguei
muitas ofertas. É uma peça linda, em todos os aspectos. Para um colecionador,
uma raridade”, frisa, mostrando, também, entre os rolos antigos, o cartaz do
primeiro filme de Vera Fischer, Anjo Loiro. “A ditadura militar proibia mostrar
os seios. Por isso, estão cobertos”, comenta, sorrindo.
Aos 54 anos, Geraldo Pires diz que continuará apaixonado
pelo cinema e que, antes da inauguração do shopping local, ainda chegou a
conversar com a direção, acerca de uma sala para exibição de filmes. “À época,
eles procuraram Luiz Pinto, com a proposta de uma sala ao preço de um milhão de
reais. Conversei com eles também, mas não tive retorno. Logo depois, veio o
cinema. As pessoas diziam que ele duraria pouco, mas não foi o que aconteceu.
Hoje, temos um cinema e um bom mercado de filmes. Mossoró comporta, sim,
investimentos dessa natureza. Até mais”, explica, frisando que continua com o
sonho de abrir uma sala de cinema e expor o material da coleção.
Geraldo não é apenas fascinado pelo cinema. Máquinas
fotográficas e discos também fazem parte do acervo. Um deles, o mais raro, é o
Abbey Road, lançado em 26 de setembro de 1969, pela banda britânica Os Beatles.
“Já colocaram R$ 500,00 neste disco. Não vendo. Tudo que está aqui é da
coleção”, comenta, mostrando a raridade, presente de um amigo.
‘Quero levá-lo para uma cidade do interior e fundar um
cinema’
Um dos sonhos do colecionador e amante da sétima arte não
poderia ser outro: “Colocar para funcionar este projetor a carvão o mais rápido
possível e montar um cinema”, fala, entre um sorriso e outro. “Aos poucos, o
Luís, que projetava os filmes do Pax, está fazendo a lubrificação. Estou
avaliando uma cidade do interior do Estado, para levar este meu projeto. Uma
delas é a cidade serrana de Martins. Acho que lá seria um lugar ideal para se
montar uma sala de cinema”, explica.
Comportando lâmpadas de 1.000 watts – que variam entre R$
300,00 e R$ 600,00 – colocar o antigo projetor para funcionar é um dos
objetivos do colecionador. Um detalhe é que as lâmpadas são sensíveis. “Tenho
que guardá-las com cuidado, pois não se pode tocar diretamente no vidro”,
explica, mostrando uma delas. “Um dos meus sonhos é adquirir um projetor
moderno, de rolo deitado, 35 milímetros, bifásico, com lâmpadas de 700 watts e
claridade de 2.000”, comenta.
Atualmente, quatro projetores de 16 milímetros estão em
perfeito estado de funcionamento e outros ainda serão montados. “Vou continuar
colecionando, passando adiante minha paixão pelo cinema, pela boa sétima arte.
Meu filho também gosta e tudo que sei passo para ele. Acho que a história do
cinema na cidade não pode morrer. Não vai morrer”, diz.
Para a irmã, Gladys Pires, Geraldo sempre foi um apaixonado
pelo cinema. “Ele foi um dos que mais frequentaram o antigo Cine Pax. É um
apaixonado pela área”, fala, enquanto o irmão, ao lado, abre a parte inferior
do projetor a carvão: “Faltam apenas alguns ajustes”, finaliza.
Texto reproduzido do site: cinepotiguar.wordpress.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário