Guia do Projecionista - parte I
Este documento, produzido em forma de pôster, tem uma dupla
importância. De um lado, com a inevitável conversão para a projeção digital,
assume uma grande relevância histórica ao registrar as questões técnicas
corriqueiras associadas com a projeção cinematográfica no tempo da película - e
antes ainda do advento do som digital e do desaparecimento do som magnético.
Por outro lado, como a projeção de cópias em películas ainda
prosseguirá mais alguns anos - se não no circuito comercial, pelo menos em
centros culturais e cinematecas - este documento traz uma expertise que está em
vias de extinção. Afinal, não só os equipamentos (projetores e peças de
reposição) estão sumindo do mercado, como também os profissionais habilitados
para manuseiar e reparar esse tipo de aparelhagem.
O texto foi transcrito de um exemplar deste pôster
encontrado no Departamento de Cinema e Vídeo da Universidade Federal Fluminense
pela Prof. Elianne Ivo. Esta é a primeira parte. A segunda virá num próximo
post.
GUIA DO PROJECIONISTA – CTAv – Embrafilme - MinC
Introdução
Este guia tem por finalidade ajudar o projecionista no
sentido de melhorar a qualidade de projeção. Aqui você encontrará diversos
problemas que podem ocorrer no projetor, no sistema de amplificação etc., com
suas possíveis causas e soluções. Desenhos esquemáticos da cabine de projeção e
de um projetor com seus componentes básicos ajudarão você a identificar cada
parte mencionada pelo texto. Além disso, o guia traz também algumas
recomendações práticas que devem ajudar ainda mais o trabalho do projecionista.
Devido a grande quantidade de marcas e modelos de
equipamentos de projeção e amplificação de som, o guia não pôde evidentemente
abranger todas as diferenças e dificuldades que variam de aparelho para outro.
Mas foram abordados aqui os problemas de maior frequência de acordo com
levantamentos feitos junto a projecionistas experientes.
No caso de surgir uma complicação maior, chame logo um
técnico especializado (Relação no Item Apoio Técnico).
Importância do projecionista
O processo de produção de um filme envolve diversas etapas:
filmagem, revelação, montagem, mixagem e cópia final. Cada etapa, por sua vez,
envolve dezenas de pessoas que tiveram o máximo de cuidado para que o filme
tivesse a melhor qualidade técnica possível. A etapa final de todo esse
processo e certamente uma das mais importantes é a projeção. É aí que vai ser mostrado
o esforço da equipa, a visão do fotógrafo, os feitos sonoros etc. É portanto a
partir da projeção que o trabalho de toda a equipe, inclusive do projecionista,
passa a ser julgado pelo público e pela critica que dirão se o filme é bom ou
rim.
Logo, cabe ao projecionista tomar certos cuidados desde o
recebimento da cópia até a sua devolução à companhia distribuidora. Só assim
ele poderá obter a melhor projeção possível, mostrando imagens e efeitos
sonoros e visuais conforme foram produzidos originariamente, além de preservar
a cópia, deixando-a em boas condições para a próxima exibição.
Todo esse cuidado beneficia o cinema como atividade e também
valoriza a profissão.
Esperamos que este guia ajude bastante aos projecionistas no
seu trabalho.
Recomendações práticas
A preparação é uma fase muito importante, pois ela permite
ao projecionista identificar previamente alguns problemas que poderiam surgir
durante a exibição do filme. Esta fase envolve a verificação, a limpeza, o
ajuste e a regulagem de diversos itens antes do início da sessão para se
reparar qualquer eventualidade.
Verificação e limpeza
A cópia do filme – O projecionista deve verificar se a cópia
do filme que vai ser exibida está completa, com todas as suas partes, e deve
efetuar imediatamente a sua montagem, com todo o cuidado necessário.
A lubrificação da cópia – Todas as cópias já devem vir do
laboratório lubrificadas. No caso de cópias ressecadas (normalmente as cópias
velhas e/ou mal conservadas), o projecionista deve fazê-la usando esponja macia
e silicone líquido.
A cópia deve ser colocada sobre uma mesa e o silicone
aplicado com a esponja, em movimentos suaves e circulares sobre as suas
laterais.
ATENÇÂO: A esponja deve ser apenas levemente umedecida com
silicone, pois as imagens e a pista de som não podem ser atingidas pelo
silicone.
O sistema de transporte da cópia (roletes, quadro
compressor, tambor de tração, debitadores etc.) – Todo o sistema deve ser
revisado. Deve-se eliminar toda a oleosidade e sujeira que estiverem acumuladas
nos roletes, na régua etc. Os roletes devem estar alinhados e o projecionista
deve verificar a sua tensão e liberdade de giro. A tensão da régua do quadro
compressor e também dos patins deve ser verificada e ajustada, caso seja
preciso. Havendo necessidade de lubrificação, não hesite em fazê-lo, mas
tomando cuidado para não deixar vestígios de óleo nos roletes e outros
componentes. Óleo acumula poeira que arranha a cópia. A lanterna – verifique o
estado dos carvões ou da lâmpada Xenon fazendo a troca, se necessário.
Limpe os espelhos, retirando primeiro a poeira com um pincel
macio ou jato de ar, e depois a oleosidade, com água e sabão neutro.
Depois verifique a distribuição da luminosidade na tela,
fazendo os ajustes necessários.
As lentes – As lentes devem estar livres de poeira e de
manchas de óleo (não toque nas lentes, pois a mão possui uma oleosidade que
mancha a lente).
Para limpeza utilize primeiro um pincel macio para retirar a
poeira e depois água e sabão neutro, em pequena quantidade, para retirar a
oleosidade.
Se possível utilize um kit de limpeza para lentes (Kodak
Lens Cleaner ou similar nacional) encontrado em lojas de cine e foto.
Após essas verificações, carregue os projetores com a cópia
e deixe rodar por alguns minutos o suficiente para ajustar o foco e o nível do
som. Não esqueça também de limpar as janelas de vidro ou vigias para não perder
a luminosidade. Para isso, utilize água e sabão neutro.
Procedendo desta forma você estará evitando a ocorrência de
vários problemas, citados neste guia, que poderiam vir a acontecer durante a
projeção.
Ajustes e regulagens
A régua – Por meio de dois parafusos conjugados a molas
pode-se aumentar ou diminuir a tensão da régua do quadro compressor, conforme a
necessidade. Normalmente estes parafusos reguladores de tensão encontram-se na
parte central do quadro compressor.
Os roletes – Os roletes devem girar livremente em torno de
seus eixos e alinhados no sistema. Existem dois sistemas de regulagem de
roletes: o primeiro é simplesmente um parafuso que funciona como eixo e
tensionador; o segundo é uma mola que regula a tensão, ou melhor, a liberdade
de giro do rolete. Independente do sistema, com uma simples chave de fenda você
consegue regular a tensão, alinhar o rolete. Não deixe de verificar o estado da
lubrificação, fazendo-a sempre que necessário.
OBSERVAÇÃO: A lubrificação deve ser feita com cuidado e sem
excesso. A quantidade de óleo deve ser suficiente apenas para envolver com uma
fina camada as superfícies a serem lubrificadas.
Use óleo de máquina Singer para lubrificar os componentes
mecânicos. Para as engrenagens, caixa do conjunto intermitente, etc., use um
óleo de maior viscosidade (por exemplo SAE 30).
Os patins – Há entre os debitadores e o tambor de tração,
uma folga ideal em relação a seus respectivos patins. Para ajustar essa folga
junte dois pedaços de filme um sobre o outro. Carregue este “duplo filme” entre
o debitador e o patins. Aperte o patins até não ser mais possível mover o
filme. Depois vá diminuindo o parto até sentir que o “duplo filme” começa a
ficar livre. Está a folga necessária aos patins.
O burrinho – O burrinho serve para manter constante a
distância entre os carvões positivo e negativo. À medida que os carvões vão se
gastando, automaticamente o burrinho faz com que o carvão positivo se aproxime,
a uma velocidade adequada, do carvão negativo, para manter a distância
constante entre os dois pólos.
Caso essa velocidade esteja excessiva ou reduzida, regule-a
através do comando (manipulador) situado na parte da lanterna junto ao
projetor.
Som
Atualmente uma grande parte dos cinemas do Brasil já possui
sistemas de som estéreo que são usados quando se apresentam filmes gravados em
DOLBY STEREO.
O bom projecionista deve ser consciente ao posicionar as
chaves de controle do som, para filmes em estéreo.
Filmes mono devem ser projetados com as chaves selecionadas
para “mono” e somente filmes gravados em estéreo devem ser projetados em
“stereo”. Atenção com os “trailers”!
Para identificar de que tipo é a cópia que você tem em mãos,
verifique as informações contidas na lata ou no começo da cópia. Alguns filmes
que foram originalmente gravados em DOLBY STEREO (inclusive conforme
informações dos cartazes) possuem algumas cópias gravadas em mono.
Outro ponto importante diz respeito ao volume sonoro com o
qual se projeta a cópia. É frequente encontrarmos casos de cinemas que,
independentemente das circunstancias, ou seja, para projeções de filmes
diferentes, ou para sessões diferentes (diferentes quantidades de público) projetam
sempre com botão de volume na mesma posição. Isto é errado, pois a intensidade
do som que chega aos ouvidos do espectador varia com o filme, com a cópia, e,
principalmente, com a quantidade de pessoas dentro da sala de projeção em cada
sessão.
Sendo assim, aconselhamos ao projecionista regular o botão
de volume para um nível confortável, baseando-se a cada sessão nas informações
de seus colegas de trabalho (gerente, lanterninha...).
Lembre-se que salas vazias exigem menos volume, e salas
cheias exigem mais volume.
Os tipos de lanterna
Em projetores de 35mm ou 70mm são utilizados basicamente
dois tipos de fonte de luz: carvão ou lâmpada Xenon.
A carvão.
Este tipo de fonte de luz era muito utilizado antigamente,
mas hoje em dia vem sendo gradativamente substituído pelas lâmpadas Xenon.
Lanterna a cavão consiste no resultado de uma grande aproximação de dois
eletrodos de carvão, que formam um caro elétrico de alta intensidade luminosa.
A Xenon.
É o sistema mais utilizado atualmente, com enormes vantagens
práticas e econômicas sobre o carvão, e que consiste em um tubo de quartzo,
contendo gás Xenon, a uma pressão em torno de dez atmosferas. Dois eletrodos
dentro do tubo, situados a uma curta distância um do outro, irão permitir à
lâmpada produzir uma grande quantidade de luz. Para isso, é necessária a
ignição da lâmpada, que é feita com a aplicação de um pulso de aproximadamente
30.000V a uma frequência entre 20 e 30 kHz. A duração deste pulso deve estar em
torno de 0,5 s (um leve toque do dedo no disparador).
Lanternas a Xenon devem ser dotadas de eficientes meios de
circulação de ar, seja por aspiração ou expiração. O fluxo de ar deve passar
pelo bulbo da lâmpada.
CUIDADO: Lâmpadas Xenon acesas ou logo depois de apagadas
podem atingir pressões internas próximas de 30 atmosferas, sendo muito alto o
risco de explosões, seja por variações bruscas de temperatura (“golpes de ar”)
ou até mesmo pelo encostar de um dedo no quartzo. Portanto, mantenha sempre a
lanterna fechada em qualquer circunstância. No caso de efetuar limpeza ou
reparos no interior da lanterna, proteja-se utilizando uma máscara de proteção
para o rosto. Mantenha sempre limpa a superfície da lâmpada, principalmente no
caso de toque acidental com os dedos. Com cuidado, utilize álcool 96º GL para
remover a gordura.
Muito importante
É muito econômico, tanto em termos de duração da lâmpada
(vida útil) quanto de consumo de energia elétrica, manter as lâmpadas
continuamente acesas enquanto houver sessões. Deve-se manter o sistema de
refrigeração das lanternas ligado por aproximadamente mais 10 minutos após a
última sessão. Além disso, as lâmpadas devem ser acesas pelo menos 15 minutos
antes de se iniciar a primeira sessão, dando tempo de se estabilizar o fluxo
luminoso.
Ajuste da lanterna
Para melhor distribuir a luminosidade na tela existem três
tipos de regulagens possíveis na lanterna
- ajuste vertical;
- ajuste horizontal;
- foco.
Primeiro regule o foco sem a objetiva. A lâmpada estará no
foco quando se obtiver a menor mancha circular preta no centro da tela.
Em seguida regula os ajustes vertical e horizontal até
atingir uma distribuição homogênea da luminosidade, ligeiramente mais clara no
centro da tela.
A corrente elétrica da lanterna
Podemos dividir as lanternas de projeção em dois tipos:
carvão e Xenon.
As lanternas são alimentadas por corrente contínua (CC)
fornecida por retificadores, que são aparelhos que convertem a corrente
alternada (CA) existente nas tomadas elétricas em corrente contínua.
Geralmente estes aparelhos têm sua entrada alimentada por
uma rede CA de três fases, fornecendo na saída uma CC, com baixa tensão
(aproximadamente 25V) e alta corrente (em torno de 80A).
Estes retificadores são equipados com medidores de corrente
(amperímetros) que dão uma indicação visual da corrente que está alimentando a
lanterna.
Observação: No caso mais comum, temos no cinema dois
retificadores (um para cada projetor), que eventualmente podem estar alojados
na mesma estrutura metálica. Neste caso, existirão dois amperímetros, que podem
estar situados no próprio retificador ou nas lanternas.
As lâmpadas Xenon têm uma faixa ideal de corrente de
operação, que vai variar com a potência da lâmpada e com o fabricante. Para
saber a corrente correta de operação da lâmpada, consulte o manual que a
acompanha.
O ajuste da corrente de operação é feito no retificador que,
para tal, geralmente possui placas de cobre móveis, que podem ser posicionadas
para uma corrente adequada.
Lembramos que este ajuste só deve ser feito quando o
retificador já estiver desligado há alguns minutos.
A intensidade de luz é proporcional ao valor da corrente, ou
seja, quanto mais corrente, mais luz.
Apoio técnico:
Normas técnicas para cinema. Centro Técnico do Audiovisual/
Embrafilme.
Som
TCE – Transisom Cine Eletrônica Ltda.
Ótica
Cinemateca Brasileira (Sr. João Sócrates).
Optotécnicas (Sr. Hans Geiser)
Mecânica
Centauro – equipamentos de Cinema e Teatro Ltda.
CTV – Comércio e Serviços Ltda.
Laboratório
Líder Cine Laboratórios Ltda.
Curt & Alex Laboratórios Cinematográficos.
Bibliografia:
1 –
Projectionist’s Troubleshooting Guide (Kodak Publication, n. 5)
2 –
Motion-Picture Projection and Theatre Presentation Manual (Society of Motion
Picture and Television Engineers, Inc).
3 – Guia Técnico do Cinematografista. Thiers T. B. Conselho
Júnior. (Editora S. Vicente, 1964).
Agradecimentos especiais: Joelson Estevão (Projecionista),
Elie Bessos (Transison Cine Eletrônica Ltda), Marcia Bello de Lamata
(Datilografia).
Autoria: Marcos Ferreira Martins (Engenheiro Mecânico),
Márcio Rubem da S. Meirelles (Engenheiro Eletrônico)
Concepção: Affonso Beato (Superintendente do CTAv).
Produção: Setores de Engenharia e de Treinamento do CTAv.
Do Professor: Rafael de Luna
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