Ivan Araújo Costa, o "Ivan Cineminha".
Por João Batista de Brito
Hoje em dia é assim: se você vai ao cinema, gosta muito do
filme e quer rever, tem que aproveitar para assistir a uma outra sessão
enquanto o filme estiver em cartaz, porque, depois disso, não haverá mais
chance de você rever o tal filme. Pelo menos, em tela grande, não.
Poderá revê-lo, mais tarde, na telinha (TV ou DVD), porém em
tela grande, nunca mais. Em outras palavras: hoje em dia não existe mais uma
prática exibidora que foi tão curtida antigamente, a saber, a REPRISE – dos
anos sessenta ou setenta para trás, algo quase tão comum quanto as estreias.
E, vejam bem, não estou me referindo a sessões e/ou
programas especiais, como as dos antigos Cineclubes. Estou, ao contrário, me
referindo à programação exibidora comercial, aquela que não tinha nenhum
compromisso com cultura ou arte.
Foi dentro dessa programação estritamente comercial que tive
a oportunidade de ver, ao longo da década de cinqüenta, quando era garoto, toda
uma gama de filmes realizados nos velhos anos 20/30/40. Por exemplo: nas
poltronas do Cine Sto Antônio, vi quase todo o Chaplin mudo, assim como vi um
monte de “O gordo e o magro” nas matinées do Cinema Bela Vista.
Hoje não teríamos a mínima chance de rever, no circuito
comercial, um filme já exibido – digamos – vinte ou trinta anos atrás, por
maior que tenha sido o seu sucesso de público. Rever “Cinema Paradiso” (1989)?
Só se for na telinha…
Pois é, conheço espectadores, que ninguém tacharia de
idosos, que tiveram a chance de ver “Casablanca” na tela do cinema
(provavelmente na década de setenta), quando o filme de Michael Curtiz é de
1942 e, por causa dos Oscar, sua estréia em território brasileiro ocorreu logo
depois de rodado. No mesmo sentido, conheço espectadores idosos que assistiram
a “A ponte do rio Kwai” (1957) ainda na década de cinqüenta, ao passo que vi o
filme de Lean no ano de 1966.
Nos velhos tempos, quando o filme fazia muito sucesso, era
comum que ganhasse recorrentes reprises locais. Não conto as vezes em que vi o
mesmo “Suplício de uma saudade” (1955) nas matinais do Plaza, alguns meses
depois do dia de sua estréia local. Posso dizer que, estourando, até os anos
oitenta a reprise ainda pôde ser praticada, talvez em caráter mais ou menos
excepcional. Acho que os freqüentadores do Cine Tambaú recordam as inúmeras
reprises teimosas de “Retratos da vida” (1981), aliás, com a sala sempre
lotada, às vezes com os mesmos espectadores. Sei disso porque estive em todas
elas.
Para a comprovação dessa verdade – a de que, nos velhos
tempos, a reprise era prática corriqueira – relato uma leitura que fiz há
pouco, particularmente instrutiva. Tive em mãos um documento precioso, que são
os cadernos de anotação de Ivan Cineminha (o paraibano Ivan Araújo Costa) onde
estão registrados à mão (!) mais de 15 mil filmes, com os devidos créditos e –
um detalhe providencial – as datas em que os filmes foram vistos/revistos pelo
autor – isso desde 1952.
Na impossibilidade de citar tudo que consultei, menciono
alguns exemplos, bem típicos. Vejam o caso de “Capitão Blood” (Michael Curtiz)
que, sendo de um ano tão remoto quanto 1935, foi (re)visto por Cineminha em
1966, cerca de trinta anos depois, ou seja, em
indiscutível REPRISE. Eis outros casos (após o ano de realização, cito a
data da reprise, anotada por Cineminha):
“Suspeita” (Alfred
Hitchcock, 1941/1964), “O intrépido General Custer” (Raoul Walsh, 1941/1965);
“Legião de heróis” (DeMille, 1940/1966); “A patrulha de Bataan” (Tay Garnett,
1943/1967); “Sua única saída” (Walsh, 1947/1965); “Sansão e Dalila” (Cecil B
DeMille, 1949/1963); “O invencível” (Mark Robson, 1949/1965); “O preço da
glória” (William Wellman, 1949/1967); “O crime não compensa” (Nicholas Ray,
1949/1964); “Espíritos indômitos” (Fred Zinnemann, 1950/1965); “Um preço para
cada crime” (Bretagne Winddust, 1951/1965); “Chaga de fogo” (William Wyler,
1951/1965); “Mogambo” (John Ford, 1953/1964).
Estes são apenas
alguns exemplos, mas a lista é surpreendentemente extensa, dando até a
impressão de que as reprises, naqueles tempos, eram mais frequentes que as
astreias. Quem quiser checar, que procure Ivan Cineminha.
Por que não se reprisa mais hoje em dia, digo, por que os
circuitos comerciais de exibição não re-apresentam filmes já apresentados? Uma
resposta possível deve estar no advento dos meios eletrônicos, que já
proporcionam acessos paralelos à tela grande (DVD, televisão, computador), logo
que o filme sai de cartaz, às vezes até antes.
O que não equivale a dizer, de modo algum, que nós,
espectadores apaixonados pelo cinema de todos os tempos, tenhamos perdido a
vontade de ver ou rever em TELA GRANDE clássicos como – digamos – “…E o vento
levou”, ou “Cantando na chuva” ou “Os brutos também amam”…
Texto e foto reproduzidos do blog: imagensamadas.com
De: João Batista de Brito
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