O presente projeto se propõe a filmar a biografia de José de
Oliveira,
artista plástico e cineasta amador de São Carlos, interior de São
Paulo.
Apresentação da proposta do filme
por Felipe Barquete e Hiro Ishikawa
O presente projeto se propõe a filmar a biografia de José de
Oliveira – artista plástico e cineasta amador de São Carlos, interior de São
Paulo.
Aos 80 anos de idade, José de Oliveira possui uma obra em
16mm composta por curtas e médias-metragens, quase todos inacabados.
A grande paixão pelo cinema data da sua adolescência, quando
começou a trabalhar nas salas de
exibição de São Carlos, nos anos
40. No trabalho, José de Oliveira se
destacou pela sua habilidade de desenho e pintura, criando os cartazes dos
filmes exibidos no cinema. Dessa
habilidade com a pintura, José ganhou o seu popular apelido de Zé Pintor.
Seus filmes foram feitos nas décadas de 50, 60 e 70. Como as
condições para a realização de cinema no interior não eram propícias, José de
Oliveira inventou um método próprio de criação – da produção ‘a copiagem dos
filmes.Além dos roteiros, ele selecionava e dirigia os atores, montava cenários
e maquetes, definia os enquadramentos, montava a luz, fotometrava e focava suas
imagens, realizava trucagens (fusões, fades, intertítulos) com técnicas
alternativas, simplificadas e muito criativas. Quando não conseguia fazer todas
essas funções, ele contava com a ajuda das pessoas ao seu redor – geralmente os
atores dos filmes e seus familiares.
A sua criação cinematográfica era tecida pelas relações de
afeto, haja visto o seu modo de produção, sempre baseado na amizade, na
cooperação, na mobilização de conhecidos para a realização das filmagens, que
ocorriam nos finais de semana.
No entanto, esses filmes, idealizados com diálogos e trilha
sonora, não foram sonorizados. Os motivos foram econômicos e tecnológicos, uma
vez que ele não teve acesso a um gravador Nagra, nem a um estúdio de som para
dublar os filmes, e o processo de sonorização em São Paulo era muito caro para
as suas condições.
Tal impasse desestimulou Zé Pintor, que engavetou suas obras
e aos poucos se distanciou da produção e da exibição de cinema. A maior parte
do material produzido por ele foi vendido, outros se perderam pela falta de
cuidado na armazenagem, restando apenas os negativos originais de seus três
principais médias metragens – Uma voz na consciência (1961), Testemunha Oculta
(1969), Sublime Fascinação
Em 2008, um grupo de realizadores fez o trabalho de
sonorização do filme Testemunha Oculta, em um processo de reconstrução do
roteiro realizado pelo próprio diretor, que assim finalizou o seu primeiro
filme 40 anos após as filmagens.
Nesse ano de 2010, o mesmo grupo, em conjunto com José de
Oliveira, está concentrado na produção de seu filme biográfico que tem como
título Delírios de um Cinemaníaco. O roteiro foi escrito pelo próprio cineasta,
em um exercício de expôr no texto, as suas paixões mais sinceras, consciente do
papel que o filme desempenha na avaliação e na reconstituição da sua memória.
A vida de José de Oliveira é marcada por sucessivas
tragédias. Ficou orfão muito cedo, aos 10 anos ele já havia perdido pai, mãe e
avós. Renegado pelos irmãos, foi viver na rua, encontrando abrigo em pensões da
cidade.
Aos 15 anos, José perde o seu primeiro e único amor – Edna –
que a partir de então se torna sua companheira espiritual e a inspiração
para a sua criação.
O trabalho nos cinemas de São Carlos foi a oportunidade de
se sustentar e amadurecer. Nesse momento, o cinema – notadamente o cinema
clássico norte-americano e europeu –
influenciou diretamente seus valores morais e estéticos, delineando a sua
subjetividade e o seu olhar sobre o mundo.
Foi com o imaginário do cinema clássico que José de Oliveira
se identificou e quando resolveu fazer filmes, recriou-o à sua maneira:
amadora, resultando em uma estética singular, retratando a sociedade
sãocarlense – os seus valores, seus hábitos, seu imaginário coletivo - com um grande poder de sedução.
A linguagem clássica é o ponto de partida da proposta do
longa-metragem de ficção, fazendo do filme uma experiência de fácil absorção
por parte do público, para acompanhar a trajetória da vida do Zé – passagens
que todos nós vivemos de algum modo: brincadeiras na infância, morte de
parentes, primeiro emprego, dificuldades emocionais.
Foi a partir do encadeamento dos acontecimentos da sua vida,
que Zé Pintor escolheu ser cineasta, ser artista, para encarar as dificuldades
e os dramas da sua vida material. José de Oliveira se construiu Zé Pintor, em
uma relação imanente com as condições que a vida lhe apresentou.
Para ele, o cinema é a magia divina que permite um homem
viver duas vezes, afastando as tristezas, encarando os fantasmas e resolvendo
os ressentimentos do coração.
As escolhas estéticas de Zé Pintor evidenciam como a
precariedade de recursos financeiros, técnicos e artísticos, possibilitam a
criação de um cinema singular, que, autodidata, utilizou a intuição artística e
o amor passional ao cinema, para criar uma estética rústica. Modo de pensar e
fazer filmes que levou o imaginário clássico de cinema a uma beleza simples e
paradoxal.
Fotos e texto reproduzidos do blog http://zepintor.wordpress.com/
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