Imagem reproduzida do Google e postada pelo blog para simples ilustração do artigo
Texto publicado originalmente no site do jornal O Norte, em 11/01/2007
Cinema de Montes Claros em exposição
O projecionista, colecionador e cinéfilo, Benjamim Ribeiro
Sobrinho expõe seu acervo cinematográfico reunido, peça a peça, desde a década
de 1940
Por Jerúsia Arruda
Com curadoria de Fábio Borges, a exposição acontece dentro
da programação do I Festival de Cinema de Montes Claros, e segue até o início
de fevereiro, na galeria Godofredo Guedes, no Centro Cultural Hermes de Paula.
As visitas são gratuitas.
Ele nasceu em 1933 em berço simples e, ainda na tenra
infância, se viu sozinho no mundo. Para sobreviver, vivia perambulando pelas
ruas e fazia pequenos serviços em troca do pão de cada dia. Para dormir, José
Paculdino o Ferreira, o Juquinha, lhe arranjou um quartinho nos fundos do
antigo Cine São Luis, na Rua Simeão Ribeiro, do qual era proprietário. Isso no
Final da década de 1930. Assim cresceu Benjamim Ribeiro Sobrinho, um menino
pequerrucho e branquelo que, graças às agruras da vida, foi tomado por uma
paixão que, como ele mesmo diz, deu norte a sua vida: a paixão pelo cinema.
Sua história se confunde com a história do cinema de Montes
Claros, pois acompanhou de perto a ascensão e queda de cada um deles, do Cine
Renascença (1921-1938) ao Cine Fátima (1960-1995). A história de um menino que
dormia nos fundos do cinema e que, para assistir aos filmes, ajudava na limpeza
das salas.
- Todos os dias ia a, pelo menos, uma sessão. Chegava a ver
10-20 vezes o mesmo filme e cada vez que via, descobria um novo detalhe, uma
nova mensagem – relembra Seu Benjamim, que diz ter visto ao longo desses anos
mais de 15 mil filmes.
Já adolescente, por volta de 12-13 anos de idade, arranjou
um emprego em uma loja frente ao Cine São Luis e ficava atento a tudo que
acontecia do outro lado da rua.
- Levantava bem cedo e ajudava na limpeza, ante de ir para o
trabalho. À noite ia ver o filme que nem sempre era próprio para minha idade.
Através do cinema conheci coisas boas e más que ajudaram a moldar minha
personalidade. Com o tempo passei a me interessar pela parte técnica, queria
saber como funcionavam as máquinas e, sempre que podia, ia para a sala de
projeção – conta.
Para matar a curiosidade, Seu Benjamim conta que pegou uns
endereços nos cartazes dos filmes e enviou cartas pedindo informações sobre
equipamentos, projetores, novas tecnologias e logo começou a receber prospectos
de grandes produtoras como Fox, Colúmbia, Universal, entre outras.
- Era tudo em inglês, mas, de tanto assistir aos filmes,
comecei a aprender a língua e decifrar os prospectos. Foi assim que comecei a
entender como as máquinas funcionavam e a dar palpites no trabalho do
projecionista, falar das novidades lançadas no mundo e onde encontrá-las no
Brasil. Acabei me tornando projecionista também e trabalhei em todos os cinemas
criados em Montes Claros a partir da década de 1950.
Durante esse período, Seu Benjamim, cinéfilo de carteirinha,
guardou prospectos, cartazes, banners e mais de 1000 sinopses de filmes, fotos,
ingressos além de diversos equipamentos que usou em seu trabalho, entre eles,
um projetor de 35mm, de 1960, a última unidade a ser produzida no Brasil – numa
fábrica em Belo Horizonte/MG - e que
usou no Cine Fátima até seu fechamento.
Todo esse acervo foi reunido com a curadoria de Fábio
Borges, de Belo Horizonte, e fica exposto durante o I Festival de Cinema de
Montes Claros e segue até o início de fevereiro.
- Estamos esperando um público de cerca de 5.000 pessoas
durante o Festival. O acervo é muito interessante e conta um pouco da história
da cidade na época - explica Fábio.
Para facilitar a compreensão dos visitantes um grupo de
monitores acompanha as visitas, explicando como eram utilizados os
equipamentos, falando sobre os filmes exibidos na época, tomando o material
exposto como referência.
O estudante de Publicidade e Propaganda, Moisés de Oliveira
Júnior é um dos monitores da exposição e se diz entusiasmado com a experiência.
- Cinema é uma paixão, eu diria, unânime, e lidar com sua
história tão de perto me deixa eufórico. A exposição nos aproxima da história
de Montes Claros e, pelos cartazes e fotos, dá para entender como as pessoas se
divertiam na época e como o cinema era presente na agenda de todos. Tenho
certeza de que essa experiência vai acrescentar muito, não só para meu
currículo, mas, principalmente, como cidadão, como pessoa, no reconhecimento da
minha formação, das minhas origens – comemora Júnior.
O professor e jornalista Elpídio Rocha, que também participa
da coordenação do Festival, diz que a presença do cinéfilo sempre foi uma
constante na história do cinema.
- Muitos diretores consagrados contam que roubaram cartazes
de filmes na infância e os guardam como um tesouro. A arte sempre desperta
paixões e, dependendo da qualidade do material que coleciona, o cinéfilo pode
se tornar uma referência histórica. Esse é o caso de Seu Benjamim, cujo acervo
que colecionou ao longo dos anos faz um resgate da história não só dos cinemas
de Montes Claros, mas de como vivia a geração no período em que estavam em
plena atividade. E esse acervo agora está servindo para recontar essa para uma
nova geração – explica o jornalista.
Seu Benjamim diz que os filmes mais badalados de que pode se
lembrar foram os filmes de faroeste, a primeira versão de King Kong, ...E o
vento levou, Romeu e Julieta, Em cada coração um pecado e Por quem os sinos
dobram.
- Apesar do sucesso dos filmes de Hollywood, os filmes
nacionais eram os que mais mobilizavam a comunidade. Os filmes de Mazzaropi,
por exemplo, as pessoas faziam filas para conseguir um ingresso – lembra
saudoso.
A história do cinema em Montes Claros, assim como sua
própria história está escrita no livro História do cinema em Montes Claros,
onde seu Benjamim narra desde as primeiras experiências com o cinema, em 1904,
até a chegada das salas de cinemas na cidade.
- O livro tem cerca de 150 páginas e está pronto para ser
editado. Estamos tentando conseguir uma editora para publicá-lo. Apesar de ter
perdido boa parte do material que guardava em um incêndio, que poderiam ajudar
na ilustração, no livro conto todos os detalhes e os momentos mais marcantes da
história do cinema.
Aos 74 anos, depois de passar por muitas dificuldades na
infância, de se sentir recompensado pela vida ao trabalhar por mais de 20 anos
na rede ferroviária Central do Brasil, seu Benjamim diz que a exposição é o seu
momento de glória.
- Esses objetos são parte de mim, representam minhas
alegrias, emoções, tristezas e dores, e ao compartilhá-los com as pessoas, me
sinto como se estivesse repartindo um pouco de mim mesmo, minha melhor parte –
conclui emocionado.
Texto reproduzido do site: onorte.net
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