Publicado originalmente no site MEDIUM, em 10 de junho de 2018
Você já viu este filme, só não viu o projecionista
Por Ayrina N. Pelegrino Bastos Maués
Na tela, um mundo de sonhos. Na plateia, um mundo de gente
que ri ou que chora, se emociona diante de tantas cenas que só o cinema pode
mostrar. Ninguém vê um dos principais personagens dessa arte. Ele fica lá em
cima, escondido em uma cabine e é quem joga vida a todas as cenas na tela. Ele
é o projecionista, o artista invisível.
Ninguém conhece, por exemplo, o Ademir Roberto Rosa, que tem
53 anos e é projecionista há 29. “Sou eu quem opera os aparelhos de projeção.
Sou eu quem coloca o filme no projetor e dou início à exibição do filme.
Acompanho para que tudo dê certo. Sou eu, também, quem cuida da manutenção de
carretéis, do equipamento, dos filmes e das lentes”, orgulha-se. E nunca se
queixa por ser um ilustre desconhecido apesar da importância do seu trabalho.
“Estamos de frente para a tela, refletidos na luz, mas os
espectadores estão de costas, por isso não nos vêem”, define Ademir, defendendo
seu emprego. Ele não sente falta do reconhecimento do público pelo seu
trabalho. “Já me acostumei. A gente trabalha para divertir as pessoas. O cinema
é a grande arte que emociona”, conta.
Ademir começou a trabalhar no Espaço Unibanco, na Rua
Augusta, em 1993, por indicação de um amigo, e ficou até 1998, quando decidiu
parar. “Não é que seja tão trabalhoso, o problema é que é cansativo, só
fechamos no Natal e no Ano-Novo. Mas é coisa que entra no sangue. Quem sai do
setor fica longe, mas sempre volta”, conta. Ele voltou em 2007, quando retomou
seu trabalho no Espaço Unibanco, onde trabalha todos os dias das 14h às 19h.
Por lei, o projecionista só pode trabalhar 5 horas por dia. Mais que isso, são
consideradas horas extras.
Cuidando da projeção de duas salas ao mesmo tempo, Ademir
inicia um filme em um cinema e corre para dar início ao outro filme em outro
cinema. E vai alternando o seu zelo entre as duas cabines. “Como os dois
cinemas ainda funcionam com películas 35 mm, é preciso uma dedicação maior.
Carrega-se o equipamento, verifica-se o estado da peça e se dá inicio à
projeção. A gente tem que zelar pelo seu funcionamento por ser um equipamento
mais antigo e mais suscetível a danos”, explica.
“Antigamente, o projecionista era obrigado a ficar na cabine
durante a exibição do filme. Hoje existe maior liberdade”, diz Ademir. “E a
coisa era séria, pois o diretor ligava a cada 5 minutos para saber se o
projecionista estava lá”, ri ao lembrar-se da situação.
José Edimar Ferreira Silva, colega de Ademir, está no ramo
há 34 anos. Ao contrário do amigo, ele gosta de permanecer na cabine durante a
projeção. “É, mas ele não fica vendo o filme, não! Ele gosta mesmo é de ler. Lê
o jornal inteirinho, de frente para trás, durante o filme”, brinca Ademir. José
diz que fica na cabine o tempo todo por precaução “Já tive que correr quando
deu problema. Nunca se sabe quando vai acontecer”, retruca José Edimar.
Por incrível que pareça, nem um nem outro se enquadra
naquela figura do “amante do cinema”. Para os dois, antes de tudo o cinema é um
trabalho. “Volto pra casa e não quero nem saber e nem ouvir falar de filme.
Filme me lembra trabalho”, conta Ademir aos risos.
Com o advento do sistema digital, a profissão vem perdendo o
valor. Hoje, quem trabalha é o computador. Ele é programado para tudo. O
projecionista apenas inicia a projeção e vigia o andamento do processo.
Invisíveis ou não, o trabalho de projecionista já virou até filme. O filme
italiano “Cinema Paradiso” projetou a imagem de um projecionista que amava o
que fazia. O personagem foi vivido pelo ator Philippe Noiret, em 1988. Um grito
de amor pelo cinema.
Publicado na versão impressa do Jornal Novo Momento da
UniFiamFaam (FMU) — Ano 34 — abril de 2012 — nº 147
Texto e imagem reproduzidos do site: medium.com
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