quinta-feira, 31 de outubro de 2024

Uma arte de projeção

Legenda da foto: Joselito Gomes, há 13 anos projecionista do Cinema da Fundação

Publicação compartilhada do blog ANDRÉDIB, de 17 de julho de 2011 

Uma arte de projeção

Praticamente invisíveis, eles estão ali, cuidando da sua sessão de cinema. Apesar de serem lembrados somente quando o filme falha, um atestado recente da importância dos projecionistas está em carta enviada pelo diretor Terrence Malick, que recomendou aos projecionistas normas de afinação do equipamento para exibir seu novo filme, A árvore da vida.

Há 15 dias, Michael Bay fez o mesmo para garantir que seu Transformers 3 não perdesse em virtude da luz filtrada pelos óculos 3D. Neste fim de semana, a produtora de Harry Potter também indicou parâmetros para sua correta exibição. A preocupação procede, já que nos últimos anos o que temos visto é a multiplicação de salas de shopping, que se preocupam mais com qualidade da pipoca do que com as condições em que os filmes são exibidos.

No Recife, poucos projecionistas “à moda antiga” estão em atividade. Com o fim dos cinemas de rua, nos quais se alternavam operadores com décadas de experiência, acabou-se também o romantismo da profissão. A gradual digitalização das salas é outro fator que aponta para o acanhamento da função. Assim como diminui a interação com o público e com o próprio filme a ser exibido, há menos intimidade com a maquinaria.

Thiago Augusto, projecionista do UCI Ribeiro Casa Forte, vê nesse distanciamento um processo de alienação. “A gente tem alcance limitado para mexer no equipamento, quando precisa tem que acionar a manutenção especializada. Além de ter um custo para o cinema, o projecionista fica de mãos atadas”.

Para Joselito Gomes, que trabalha no Cinema da Fundação, no futuro próximo bastará alguém que saiba apertar botões, já que a projeção digital se resume a acionar aparelhos pré-ajustados. “Uma sala de shopping com 12 salas desempregou 11 projecionistas. Para quem está começando talvez isso seja um sofrimento, porque esta é uma profissão que apaixona”. O segredo para uma boa projeção? “Tem que ter sensibilidade e estar atento, senão o público deixa de prestar atenção no filme para reparar nos problemas”.

Joselito começou no extinto complexo Trianon – Art Palácio. Em 1998 foi para o Cinema da Fundação, por indicação do falecido Seu Alexandre (Moura), que não pôde assumir pois já trabalhava no Cinema Arraial. “Aprendi olhando. Fui contratado como mecânico do ar-condicionado, mas era rato de cabine. Chegava mais cedo e treinava, fui pegando o jeito até que chegou um tempo em que o projecionista ia dormir e eu ficava fazendo o serviço dele”.

Depois de contratado, Joselito testemunhou várias situações inusitadas – outras apimentadas – mais nada como o dia em que, durante sessão superlotada de Rambo 3, o público quebrou tudo, até as poltronas. “O gerente quis exibir uma cópia para duas salas. Como o rolo não chegou a tempo no outro cinema, o público protestou. Teve gente que até arrancou a camisa”.

Antes de trabalhar no Apolo, Luciene Arruda começou a carreira no UCI Ribeiro Recife. “Queria trabalhar na bomboniere, mas como tenho curso de eletrotécnica, me escalaram para a cabine. Quando entrei, fiquei horrorizada e quis desistir, eram dez máquinas!”. As condições de trabalho também não eram as melhores. “Lá você não respira, não para pra comer, até ir ao banheiro é complicado”.

Luciene é uma das poucas – se não a única – representante feminina numa profissão tradicionalmente masculina. “Sou uma enxerida”, se classifica. “Eles dizem que eu sou pequena demais pra subir e descer escada com os rolos, mas pra trabalhar direito, precisa é disso aqui”, diz, apontando para a cabeça.

Thiago Augusto, que já trabalhou no Box Guararapes, compartilha a opinião. “É bem cansativo. Acontecia muito de ficar sozinho nas 12 salas. Não sei como o Box está hoje, mas na época foi bem difícil”. Chamado para o UCI Casa Forte, Thiago chegou a trabalhar na montagem das salas. “Como eu comecei com a carga pesada no outro complexo, tiro as cinco salas de letra. E em termos técnicos, o Casa Forte é o paraíso dos projecionistas”.

Vidas dedicadas ao cinema – Os projecionistas entrevistados pelo Diario concordam que esta é uma profissão apaixonante. O que mais justificaria vidas inteiras dedicadas, inclusive fins de semana madrugadas adentro? Paulo Bezerra Bento, o mais antigo em atividade no Recife, começou como zelador no Cine Nossa Senhora de Fátima, em Paratibe e passou por vários outros desde então. “É uma profissão muito esquecida, as condições não são ideais”. Lá de cima, na cabine, ele disse que já viu de tudo. “Casal que namora, gente que dança, bate palma. Já vi até soltar bomba de São João”.

Já André Viana, assumiu o cargo do projecionista do antigo Cine Ribeira, pois o titular havia tomado uma cachaça na noite anterior. Anos depois, quando começou a trabalhar no Cine Floriano (onde hoje funciona uma igreja), nem poderia imaginar que ali, entre uma sessão e outra, iria conhecer a mulher com quem está casado há 25 anos. “A irmã era funcionária e a família dela estava sempre por lá”. Sem esconder a tristeza, ele lamenta não ter tido condições para ficar mais tempo perto da família. “Sustentei meus filhos com essa profissão. Mas não pude estar mais presente”.

Categoria quer mais reconhecimento – No circuito comercial, o salário de um projecionista está longe de corresponder à responsabilidade de sua profissão. Não há um sindicato próprio, o que diminui sua força com os patrões. “Só sei das reclamações, nunca dos elogios”, afirma Thiago Augusto que, da solidão de sua cabine, diz se sentir sozinho. “Muitas vezes nossa voz não é ouvida. As preocupações são outras, pois bilheteria é o menor dos lucros, o grosso vêm dos produtos vendidos na bomboniere. É com isso que eles se preocupam”.

Estudante de história, Thiago participa de um movimento para organizar um sindicato. “A insatisfação é grande. O salário não é ajustado há anos, a gente ganha no contracheque R$ 670. Tem gente lá embaixo vendendo pipoca que ganha mais do que a gente. Esse sentimento de estagnação leva a gente a pensar em procurar coisa melhor”. E não só Thiago tem outros planos para a carreira. Seus colegas também. “Todos adoramos aquele trabalho, é um emprego tranquilo. Mas estamos procurando outras coisas. É uma pena, pois é uma profissão bonita, é prazeroso promover uma sessão perfeita pra quem está assistindo”.

Para preparar novos profissionais, a Fundação Joaquim Nabuco tem o projeto de oferecer, em parceria com a Fundarpe, um curso de capacitação em que Joselito e Luciene fossem os professores. No entanto, o projeto ainda não saiu do papel.

O ranking dos projecionistas

Joselito Gomes

Dançando no escuro

Buena Vista Social Club

Irreversível

Gandhi

O último imperador

Paulo Bezerra Bento

Os dez mandamentos

Ben Hur

A noiva

O Corcunda de Notre Dame

… E o vento levou

André Tadeu Viana

Dio como te amo

Dirty dancing

A força do destino

O cobra

Luciene Arruda

O rap do Pequeno Príncipe contra as almas sebosas

Amistad

Julie & Julia

O discurso do Rei

Piaf

Thiago Augusto

Bastardos inglórios

Cisne negro

A conquista da honra

Bravura indômita

Meia-noite em Paris

Orientações de Terrence Malick para os projecionistas

1. O filme deve ser projetado no formato 1.85:1;

2. Por não conter créditos de abertura, “as luzes devem ser apagadas antes do frame inicial do primeiro rolo de filme”;

3. Coloque o Fader dos sistemas Dolby e DTS em 7.5 ou 7.7 (maior que o padrão 7);

4. As lâmpadas de projeção devem estar em “funcionamento padrão” (5400 Kelvin) e que o nível Foot-Lambert [medida de luminosidade comum nos EUA] esteja no “padrão 14”

(Diario de Pernambuco, 17/07/2011)

Texto e imagem reproduzidos do blog: andredib wordpress com

segunda-feira, 21 de outubro de 2024

Seu Vavá ganha sala no Cineteatro São Luiz

Legenda da foto: Com 45 lugares, Sala Seu Vavá é espaço de difusão e memória do audiovisual cearense - (Crédito da foto: Fabiane de Paula / Divulgação)

Legenda foto: O diretor do Cineteatro São Luiz José Alves Netto (à esquerda) com 
Duarte Dias (penúltimo à direita) e a família de Seu Vavá 
na solenidade especial de abertura da sala
Crédito da foto: Guilherme Silva

Duarte Dias, programador e curador do cinema do Cineteatro São Luiz


Acervo do seu Enondino Bessa, cinéfilo e crítico de cinema ligado ao Clube de Cinema,
 foi doado pela Academia Cearense de Cinema ao Cineteatro São Luiz






Publicação compartilhada do DIÁRIO DO NORDESTE VERDES MARES, de 30 de maio de 2024

Guardião do último cinema de bairro de Fortaleza, Seu Vavá ganha sala no Cineteatro São Luiz

Por João Gabriel Tréz 

Vida e obra de Raimundo Carneiro de Araújo (1930-2022), proprietário do Cine Nazaré, no bairro Otávio Bonfim, são homenageadas

Patrimônio conhecido de Fortaleza, o Cineteatro São Luiz acolhe em si outro espaço de salvaguarda da memória audiovisual cearense. No 5º andar do prédio anexo ao equipamento, desponta para o público da Cidade a Sala Seu Vavá, batizada em homenagem a Raimundo Carneiro de Araújo (1930-2022).

Proprietário do Cine Nazaré, último cinema de bairro de Fortaleza, no Otávio Bonfim, ele é considerado nome “incontornável” do parque exibidor da cidade. Incorporada ao circuito público de cinema do Governo do Estado, a Sala Seu Vavá deve abrir oficialmente em agosto, mas já recebe programação especial para “se apresentar” à plateia a partir desta quinta-feira (30). Em visita, o Verso destaca planos e vocações do espaço.

Sala de memória e afeto

“É uma sala construída em torno da memória e do afeto”, atesta Duarte Dias, curador e programador de cinema do São Luiz. A afirmação vem tanto por conta do envolvimento da família de seu Vavá no projeto, quanto pela relação histórica dele com o, hoje, cineteatro.

Tela, poltronas, projetores históricos e películas de filmes antigos foram doados pelas filhas do homenageado. Os assentos, inclusive, são originais do São Luiz. Em uma das reformas do equipamento, seu Vavá adquiriu parte das poltronas que seriam trocadas. 

“Quer dizer, elas estão voltando para casa e, ao mesmo tempo, trazendo a memória ligada a ele”, define Duarte. 

Como foi o caso com os móveis, ele montou o Cine Nazaré — que assumiu entre o fim dos anos 1960 e o início dos 1970 — “através de doações e compras” de itens de outros exibidores, como explica Duarte.

“O cinema dele, de certa forma, constitui um memorial desse circuito, porque ele ia montando equipamentos de outros cinemas, então acabava funcionando como uma espécie de museu vivo, atuante”, caracteriza.

A aproximação de seu Vavá com o Cine São Luiz é ainda anterior e vem dos anos 1950. “Na época, o papai ainda não era proprietário de nenhum cinema. Ele trabalhava para o Cine Familiar (ligado a padres franciscanos e que também funcionava no Otávio Bonfim) e a relação com o São Luiz era porque ele ia pegar as películas lá”, lembra Inalba Araújo, filha do homenageado.

Acervos

Filmes que vieram do Cine Nazaré serão identificados, catalogados e recuperados em parceria com o Museu da Imagem e do Som do Ceará

Entre as películas doadas ao Cine São Luiz, há mais de 100 rolos de filmes de 8, 16 e 35 mm. Segundo Duarte, está sendo estudada uma parceria com o Museu da Imagem e do Som do Ceará para avaliação, identificação, catalogação e eventual recuperação das obras. Uma vez restaurados, os filmes devem compor uma futura mostra na sala principal do São Luiz. 

Além do acervo ligado ao Cine Nazaré, o equipamento também recebeu outro acervo histórico e robusto, este ligado ao cinéfilo, crítico e engenheiro civil Enondino Bessa. Dezenas de livros sobre cinema, DVDs, blu-rays e CDs foram doados pela viúva, Evan Bessa, à Academia Cearense de Cinema.

A instituição, então, repassou o rico acervo para a guarda do São Luiz. “Nós estamos catalogando e a ideia é que esses livros e filmes possam ser disponibilizados à comunidade para consulta e eventuais sessões, já que a gente também quer construir ao longo do segundo semestre um processo que abrigue cineclubes (na Sala Seu Vavá)”, adianta Duarte.

Programação

Ainda em janeiro de 2024, a Sala Seu Vavá ganhou uma solenidade especial de abertura para as famílias do proprietário do Cine Nazaré e de seu Enondino Bessa. De lá para cá, o espaço recebeu programações pontuais e menores, por exemplo, em parceria com a ACC.

O diretor do Cineteatro São Luiz José Alves Netto (à esquerda) com Duarte Dias (penúltimo à direita) e a família de Seu Vavá na solenidade especial de abertura da sala

“Durante esse processo de pequenas exibições, a gente estava correndo paralelamente com a solicitação de registro (da sala) na Ancine (Agência Nacional de Cinema), porque ela precisava reunir determinadas condições técnicas para ser reconhecida como capaz de entrar no circuito nacional de cinema”, explica Duarte.

O processo foi concluído em maio e, desde o dia 13, a Sala Seu Vavá entrou oficialmente para o circuito público de cinema do Ceará, somando-se à sala principal do Cineteatro São Luiz e às duas salas do Cinema do Dragão. Com isso, ela poderá acolher exibições comerciais.

A partir desta quinta-feira (30) e seguindo até o sábado (1º de junho), o espaço irá acolher uma mostra de filmes do espanhol Pedro Almodóvar. A experiência, define Duarte, é para “dar conhecimento ao grande público” sobre o local de exibição.

“Daí a gente vai fazer uma parada em junho e julho e fazer alguns pequenos ajustes para recepcionar o público de uma maneira ainda mais interessante quando do início das atividades”, segue. A data prevista para essa ação plena da Sala Seu Vavá é agosto deste ano.

Como Duarte reconhece, “em uma sala de 45 lugares a programação tende a ser diferente de uma de 1050”. “A ideia é que a gente abra o espaço para filmes do circuito brasileiro e, particularmente, cearense, para que a gente possa radicalizar mais ainda essa proposta”, adianta o curador.

"Pensando em termos de Brasil, o número de salas de cinema não é suficiente, ideal para o tamanho da população. Cada sala de cinema que chegue, em qualquer que seja o lugar, é preciosa no sentido de você poder oferecer à produção brasileira mais uma possibilidade de encontro com o público”, celebra.

História eternizada e dinamizada

Além da história presente nos acervos e nos itens da própria Sala Seu Vavá, o Cineteatro São Luiz estuda construir, na antessala do espaço, “uma espécie de memorial” do audiovisual cearense. 
“O São Luiz é o último cinema de rua de todo um ciclo muito importante do cinema cearense em termos de exibição, que se concentrava aqui na (rua) Major Facundo”, ressalta Duarte.

O curador avança: “A gente está muito empenhado em fazer um espaço que contribua para o circuito exibidor, mas também para a preservação dessa memória que passa pelo seu Vavá, pelo Severiano (Ribeiro, empresário fundador da rede de cinemas homônima e do Cine São Luiz) e por esses outros cinemas que existiram aqui”.

“Aqui é uma sala que as pessoas vão poder usufruir de cinema, mas ao mesmo tempo ter contato com esse histórico do cinema no Ceará, preservado por essa pessoa tão apaixonada pela sétima arte que é o seu Vavá”

“Foi a coisa que ele mais amou na vida, sabe? Ele amou a sétima arte. Desde que eu me entendo, o papai foi focado em filme, cinema, nas artes”, partilha dona Inalba, que lista “sensibilidade”, “dons artísticos”, “visão crítica”, “não ao preconceito” e “gosto pelas artes” como importantes legados simbólicos recebidos enquanto filha de seu Vavá.

“A importância desse legado é para um contexto geral: agora a gente tem faculdade de cinema, de audiovisual, de teatro, tanta coisa. Não é só para a gente”, aprofunda a herdeira, ressaltando a doação do acervo do Cine Nazaré como um “momento histórico”.

Seu Vavá tem legado 'incontornável' na história do audiovisual cearense

“Fico muito feliz se puder ajudar, contribuir de uma forma pequena, modesta. Isso é estar dando um pouco do que ele tanto amou. Ele, embora não esteja vivo, foi quem mais ganhou: é a eternização dele através do cinema”, considera Inalba.

Duarte reforça o caráter dinâmico e atual dessa história. “A gente tem a oportunidade de revê-la, resgatar personalidades e acontecimentos, ver o que está sendo feito e projetar o que pode ser feito em termos de preservação desse legado e desse momento de produção muito forte”, reflete. 

“Efemérides são importantes pelo que podem dialogar com o mundo contemporâneo e pelo que isso pode suscitar. Todo o movimento que a gente vem fazendo aqui no São Luiz — e a Sala Seu Vavá também está inserida nisso — é buscando, de alguma maneira, fortalecer a consciência em torno da memória e da importância da nossa história”, finaliza.

Seu Vavá em São Paulo

Exposição 'Uma Rua Chamada Cinema', do fotógrafo Sergio Poroger, traz registros de seu Vavá

Além da homenagem no Cineteatro São Luiz, seu Vavá também está sendo lembrado na exposição "Uma Rua Chamada Cinema", do fotógrafo Sergio Poroger. O projeto do artista reúne fotos de salas e trabalhadores de cinemas de rua de todo o mundo, incluindo o tradicional Cine Nazaré e seu proprietário. 

A mostra compõe o projeto "Maio Fotografia", do Museu da Imagem e do Som de São Paulo. No total, são 36 obras assinadas pelo fotógrafo e também jornalista. A pesquisa de Sergio começou ainda em 2017, nos Estados Unidos. Além de seu Vavá, o próprio Cineteatro São Luiz também foi registrado pelo paulistano.

Texto e fotos reproduzidos do site: diariodonordeste verdesmares com br

sábado, 19 de outubro de 2024

Cabine de Projeção > Cinema Analógico

Post compartilhado do site REDDIT

Por Scurvy Bagel

Cabine do projetista de um cinema em Ontário, Canadá - início dos anos 1970

Naquela época, só passava um filme, mas você tinha a opção de assistir às 19h ou às 21h (ou durante as matinês de fim de semana à tarde, se você quisesse). Você podia fumar na varanda ou nas últimas 15 fileiras do andar principal do auditório e geralmente assistia a um ou dois desenhos animados antes do filme principal começar.

Havia dois projetores na cabine e os filmes eram divididos em vários rolos. O projetista alternava entre os dois projetores em um ponto no tempo que era indicado por pequenas marcas que eles faziam no canto superior direito do filme. Quando a primeira marca aparecia na tela, o projetista ligava o segundo projetor e o deixava funcionar em conjunto com o primeiro. A segunda marca indicava quando ele deveria mudar para o segundo projetor e o novo rolo seria exibido na tela.

Texto reproduzido do site: www reddit com

quinta-feira, 17 de outubro de 2024

Uma Janela de Sonhos' lembra 70 Anos do Cine Teatro Cuiabá

Artigo compartilhado do site SECEL MT, de 6 de Maio de 2012 

Exposição audiovisual 'Uma Janela de Sonhos' lembra 70 Anos do Cine Teatro Cuiabá

Por ÂNGELA CORADINI Assessoria/Cine Teatro Cuiabá

Em 23 de maio de 1942, o Cine Teatro Cuiabá (CTC) era inaugurado, com a estreia nacional do filme da Warner Bros “A Noiva caiu do Céu”, com Bette Davis. Foyer lotado, olhos atentos, ansiedade: pela primeira vez exibia-se um filme sonoro em Cuiabá. A cultura cinematográfica passava a reger parte da vida na cuiabania. Durante 70 anos, o Cine Teatro marcou início e fim de muitas histórias de amor, desavenças, superstições e sonhos, que ainda coabitam entre as paredes da casa. Os espetáculos cênicos e cinematográficos, além de inebriar os sentidos, também eram pretextos para encontros e namoricos nas longas matinês de domingo. Do auge ao fechamento, dos anos parado à reforma, construiu-se um imaginário repleto de boatos, lembranças e arte. Na busca por revelar um pouco destas histórias e da atmosfera de seus primeiros anos, o CTC, a partir do dia 08, realiza a exposição audiovisual “Uma Janela de Sonhos”, com acervo e curadoria do historiador e ex-projecionista, Aníbal Alencastro. Projetores, câmeras domésticas, gramofones, fotos, documentos, mobiliário e posters de filmes da época serão expostos no Salão Artístico do CTC, exibindo um pouco da riqueza das relações sociais que permeavam a casa. \"A exposição, também terá a exibição de filmes curta metragens que movimentaram as primeiras décadas da casa como ‘As Aventuras de Rim Tim Tim’ (PB, sonoro), ‘Um Verdadeiro Xerife’ (PB, sonoro) e ‘Pantanal Sangrento’ (Colorido, mudo). As três películas serão rodadas em um dos projetores que fazem parte do acervo da exposição: projeto bitola de 16mm, sonoro, fabricado pela IEC, no Rio Grande do Sul, na década de 50. Dentre os documentos expostos está um exemplar das cartelas de filmes que eram disponibilizados para compra. “Estas cartelas tinham todas as opções de filmes que poderiam ser adquiridas pelo teatro. Normalmente os filmes chegavam aqui um ou dois anos depois de estrearem em grandes cidades. A exceção é ‘A Noiva Caiu do Céu’ que teve sua estreia nacional em Cuiabá. Era de praxe na época exibir filmes inéditos nas inaugurações dos cines teatros”, lembra Seu Aníbal Alencastro. Outra peça é um gramophone, de 1877, muito utilizado nos tempos de cinema mudo. O equipamento era colocado ao lado das telas para dar sonoridade aos filmes quando não era possível a contratação de uma orquestra. “Em Cuiabá, no antigo Cine Parisien, a opção de cinema antes do Cine Teatro, nós encontramos registros da presença de uma orquestra composta por Eugênio Honório Sigmaringo, Zulmira Canavarros, Zé Agnelo, Dunga Rodrigues, dentre outros, que executava canções ao pé da tela”, lembra Seu Aníbal. Além dos primeiros bancos utilizados no Cine Teatro, os visitantes poderão conhecer vários cartazes originais de filmes como ‘O Desafio dos Gladiadores’, ‘Django Atira Primeiro’, Vivendo Perigosamente’, ‘Joe Dakota’, ‘Um Gigante Contra o Nazismo’ e ‘Sua Lei Era Vingança’. Agendamentos escolares Além das visitas espontâneas, a casa irá trabalhar com agendamentos para grupos de instituições de ensino. As datas estão praticamente fechadas, mas ainda há alguns horários disponíveis para escolas interessadas em levar grupos de até 40 alunos, no período vespertino. A diretora artística da casa, Paula Naves, conta que a ideia da exposição veio das inúmeras conversas com Aníbal Alencastro, onde as histórias e o amor pelo Cine Teatro ficavam evidentes nas descrições do ex-projecionista. “Até culminar na montagem da exposição, eu e o senhor Aníbal nos reunimos várias vezes para conversarmos sobre o CTC. Foi uma verdadeira aula promovida por este historiador e amante do cinema, que sempre dizia: as crianças e os adolescentes irão gostar!”, lembra. E foi com a expectativa de que os mais jovens pudessem ter contato com os equipamentos utilizados nos anos 40 que os agendamentos escolares foram pensados. “Receber no Cine Teatro Cuiabá, educadores e estudantes, é fomentar o acesso social, promover atividades para o conhecimento e estimular o imaginário para o valor cultural promovido pelo cinema e por este espaço que completa 70 anos de muita ficção e realidade\", pontua. Horário e sessões A abertura da exposição “Uma Janela de Sonhos” acontece no dia 08 de maio, às 19h, para convidados e autoridades. O acervo fica exposto de 09 a 31 de maio, no Salão Artístico do Cine Teatro Cuiabá. A entrada é gratuita com visitação de terça a sexta-feira, das 14h às 18h. Já a exibição das películas acontece de terça a quinta-feira, em dois horários: 15h15 e 16h45. Como a atividade utilizará o mesmo espaço da exposição, a disponibilidade é de apenas 40 lugares, com um filme por sessão. Programação de aniversário Além da exposição audiovisual, para comemorar os 70 Anos do Cine Teatro, o Instituto Matogrossense de Desenvolvimento Humano (IMTDH) e a Secretaria de Estado de Cultura (SEC) realizam no dia 21 de maio, às 21h, o lançamento do Selo Comemorativo aos 70 Anos e o Concerto de Aniversário com a Orquestra Sinfônica da Universidade Federal de Mato Grosso. No dia 25 de maio, às 20h, a crítica de arte, Aline Figueiredo, ministra a palestra \"História das Artes Plásticas em Mato Grosso: arte pré-histórica, período colonial e contemporâneo\". Toda a programação é gratuita. Serviço Exposição audiovisual “Uma Janela de Sonhos”, Acervo e curadoria de Aníbal Alecastro Período: 09 a 31 de maio Visitação: terça a sexta-feira, das 14h às 18h Exibição de películas: terça a quinta-feira, às 15h15 e 16h45...

Texto reproduzido do site: www secel mt gov br

quarta-feira, 9 de outubro de 2024

Eles sempre terão o cinema

 


Publicação compartilhada do site CINEMA ESCRITO, de 28 de julho de 2023

Eles sempre terão o cinema

Cinéfilos que não medem esforços pelos seus amores

Por Luiz Joaquim 

“Em 1991 minha família passava dificuldade financeira. Eu mal tinha dinheiro para pagar o ônibus e ir ao colégio. Mas quando conseguíamos ir ao cinema era como entrar num outro mundo, eu fugia da minha realidade. Daí, saía encantado da sala e, como um fotógrafo que procura a melhor luz e enquadramento, eu olhava para a paisagem na rua e a enxergava como a cena de um filme imaginário dentro da minha cabeça. Era assim que eu esquecia as minhas necessidades”.

As lembranças são de Wlademir Moura (na foto acima), 37 anos, engenheiro e cinéfilo. Com as recordações da adolescência, ele tenta compreender a origem de uma paixão tão grande quanto insaciável pelo cinema. Seu encantamento representa o de milhões de abnegados pelo mundo que, pelo menos uma vez, já se sacrificaram para o simples ato de ver um filme, e dessa prática, fizeram nascer um misto de admiração, respeito e carinho.

Uma vez que a cinefilia* (ainda) tem uma relação intrínseca com o lugar onde se vive, o CinemaEscrito procurou identificar como seria o cinéfilo pernambucano de ontem, de hoje e do futuro. Para tanto, conversou com três gerações destes apaixonados: Jamysson Marques, 67 anos, residente no bairro de Campo Grande ; Yuri Lins, 17 anos, que mora em Cabo de Santo Agostinho; e, claro, Wladermir Moura, da Iputinga.

*Cinefilia – Nos anos 1950, o termo cinefilia começou a conquistar seu lugar na história cultural do século 20 ao inventar uma forma de ver e compreender o mundo através do cinema.
Wlademir Moura, 37 anos, engenheiro

Se a memória é seletiva em acordo com as coisas que se ama, Wlademir é um exemplo perfeito. Ele lembra, por exemplo do que sentiu quando foi ao cinema pela primeira vez. “Era o filme -Popeye-, passava no Ritz ou Astor, e eu tinha uns seis anos. Uma coisa que achei estranha é que lá havia uma área para fumantes, e meu pai passou a sessão inteira ali. Ainda achei esquisito o fato de puder existir um filme com gente de verdade, que não fosse um desenho animado. Tive medo do escuro também”, diz.

Dessa fase recorda com carinho também dos filmes com Os Trapalhões, no Veneza, e da primeira vez que foi ao cinema sem os pais. O título escolhido foi “Os Caça-Fantasmas”, visto no Art Palácio. Em 1990, ele passaria por uma experiência inesquecível no São Luiz vendo “Esqueceram de Mim” – “Imagine 1300 pessoas rindo consecutivamente por quase duas horas!”, conta. A partir daí, o desejo de continuar com aquela alegria não parava e Wlademir passou a assistir a tudo que conseguia, e as idas aos cinemas no centro do Recife com os pais e irmã mais nova passaram a ser bastante esperadas.

Wlademir lembra especialmente de um domingo em que foram ver “Ghost”, no Veneza (rua do Hospício), mas a fila estava na avenida Conde da Boa Vista. “Desistimos e fomos ao São Luiz, mas -Dança com Lobos- estava lotado. O Moderno exibia -O Poderoso Chefão 3-, cuja censura era proibitiva para mim e para minha irmã; fomos ao Art Palácio e para -Tempo de Despertar- não havia ninguém na frente. Aí meu pai desconfiou que o filme não prestava. Voltamos todos pra casa, eu com uma revista Set e minha irmã com a Fama”.

Logo depois viria a fase mais difícil de sua família, e as idas ao cinema diminuíram. “Eu estudava no Ginário Pernambucano e quando acabava a aula, saía fazendo um tour pelos cinemas da cidade. Ficava conversando com os porteiros, até que um dia eu perguntei se não podia entrar de graça. Qual foi minha surpresa quando consegui no Art Palácio entrar de graça para ver -Hudson Hawk-. Lá dentro, eu fiquei uns 30 minutos sem acreditar que tinha entrado. Resultou que vi três sessões seguidas”.

Como o amor da sua geração ao cinema passa pelo carinho com as salas onde assistiu todos esses e outros filmes, Wlademir recorda de sua preocupação quando soube, em 2006, que o São Luiz poderia fechar. “Certa vez eu lotei dois carros, um Fiesta e um Fusca. Eramos 16 pessoas, várias crianças, para ver -A Era do Gelo 2-. Eu não queria que o cinema fechasse e era a forma que eu tinha de colaborar, levando os amigos ao cinema, formando um público já habituado a ir para shopping”.

Dono de mais de 400 DVDs, Wlademir revela que não viu nem metade deles. “Eu os compro para ter perto os títulos do coração. Meu prazer é mesmo ir ao cinema e dou graças a Deus que ainda existam o Rosa e Silva, a Fundaj, e o São Luiz. À propósito, Geraldo Pinho [programador do São Luiz] faz milagres ao colocar quatro diferentes filmes em cartaz lá. A situação ali está muito precária. Até hoje aguardo a inauguração do projetor digital que o governo anunciou à imprensa na mesma época da Fundaj. Sobre o Apolo, vale ressaltar o esforço dos funcionários que o mantém funcionando. Sobre o Cineteatro do Parque então, melhor nem falar”, indigna-se.

Queixas à parte, o cinema lhe deu também a felicidade de conhecer Karyne Brito. “Há sete anos, fui assistir -O Senhor das Armas- no Shopping Boa Vista. Ela estava lá escolhendo o que ver. Assistimos a sessões juntos e depois veio o namoro”, conta. O resultado é que, em setembro, Wlademir e Karyne consagram-se como marido e mulher.

— O programador Wlademir

Até os anos 1980, os grandes cinemas do Severiano Ribeiro no Recife tinham um perfil bem particular de programação. O cinéfilo Wlademir Moura costuma brincar e pensar os que eles exibiriam hoje (2013).

“Meu Malvado Favorito 2”

Entraria em cartaz no Veneza. Era famoso por receber as produções infantis, como “E. T.: O Extraterrestre” e os filmes de Os Trapalhões. Quando lotado de crianças, parecia um parque de diversão.

“O Homem de Aço”

Exibiria no cine São Luiz. Era o espaço para lançar as superproduções de Hollywood. O próprio “Super-Homem: O Filme”, de 1978 com Chistopher Reeves, foi lançado ali.

“O Cavaleiro Solitário”

Por ser a sala “adulta” do Grupo no centro do Recife, estrearia no cine Moderno. Lá exibiam os filmes mais picantes, além de outros de aventura como “Indiana Jones”.

Jamysson Marques,67 anos, advogado aposentado

“Eu não acho que minha história seja importante” é assim que o advogado aposentado Jamysson Marques, começa a conversar com a reportagem. Desconfiado de que sua paixão pelo cinema não valesse a pena ser contada no jornal, preferiu inclusive nem ser fotografado. O sexagenário é mais uma prova viva de como a lembrança vincula-se ao que se ama. Mesmo após ter visto milhares de filmes – “só em casa tenho, por baixo, 3.000 títulos entre DVD e VHS -, o cinéfilo não esquece de sua primeira sessão num cinema.

“Fui levado pelo meu pai para ver -Um Conde em Sinuca-, com Bob Hope, no cine Eden, em Campo Grande. Naquela época [anos 1950], o bairro tinha também o cine Vera Cruz. Foram eles que alimentaram minha infância com filmes e desenhos animados. Ali vi também -Branca de Neve- e depois muitos filmes com Cantinflas e Oscarito”.

Na adolescência, veio o natural interesse pelos títulos de ação, em particular aqueles com o personagem italiano Maciste e suas aventuras de capa e espada; além de, claro, ter sido seduzido pelo apelo de produções hollywoodianas. Entre elas “Os Canhões de Navarone”, “Ao Mestre com Carinho”, “Adivinhe quem Vem para o Jantar”, “Laranja Mecânica”, “Tubarão” e outros tantos.

Como qualquer cinéfilo, Jamysson foi acumulando ao longo da vida um impressionante acervo – que mantém até hoje – incluindo críticas de jornais, fotografias, livros e revistas que remotam aos últimos 60 anos de história do cinema – como “Cinelândia” e “Filmelândia”. Nessa paixão, o cinema europeu tinha um lugar especial em seu coração. “Recordo que -Dio, Come Ti Amo!- levava tanta gente ao cine Trianon, que a gente o apelidou de -Dio, Come Fatura!-.

Acervo de Jamysson Marques, reprodução de Peu Ricardo, 2013

Entretanto, seu mais marcante encantamento nasceu na Espanha e atendia pelo nome de Sara Montiel (1928-2013). Fã, a ponto de possuir fotos exclusivas da atriz e cantora, Jamysson teve três encontros diretos com a ídolo Sarita. “Em 1975, ela veio dar um show no Recife, no Geraldão. Antes concedera uma entrevista para Celso Marconi, Airton Cavalcanti e Fernando Spencer. Este último me perguntou se eu gostaria de ir também. Nem acreditei. Fui lá e fiquei quietinho só observando”.

“O segundo encontro foi por acaso em 1996, quando eu estava no aeroporto de Madrid. Voltava para o Brasil e a vi no saguão. Me aproximei sem jeito e perguntei se ela podia autografar um CD. Eu trazia comigo 42 CDs dela que acabara de comprar lá. Sarita tomou um susto e riu. O último encontro foi no Cine Ceará, que a homenageou em 2002. Ela cantou três músicas no cine São Luiz de Fortaleza. Eu queria lhe presentear com fotografias raras e acabei sendo recebido pela própria no apartamento onde ela estava hospedada”, conta sem esconder o entusiasmo.

Nos dias de hoje, Jamysson alimenta sua cinefilia indo apenas ao cine São Luiz e ao Cinema da Fundação. “Quando vou, sento na terceira fila pois aí não encontro gente fazendo pique-nique nem mexendo no celular. Compro muitos DVDs para assistir em casa. Não gosto de shopping center, infelizmente as pessoas hoje são mal educadas e as sessões de cinema não são as mesmas”.

— O ator Jamysson

A proximidade com artistas e jornalistas levou Jamysson Marques a fazer figuração em alguns filmes. Os atentos o encontrarão em “O Cangaceiro”, a refilmagem feita por Anibal Massaíne Neto; em “Casa Grande & Senzala”, de Nelson Pereira dos Santos; e em “Bezerra de Menezes: O Diário de Um Espírito”, de Glauber Filho e Joe Pimentel.

Yuri Lins, 17 anos, estudante

O mais jovem cinéfilo do grupo, Yuri Lins, ainda nem prestou vestibular. Vai fazê-lo no final de 2013 para estudar cinema, mas já fala com a propriedade de um grande conhecedor de obras que foram feitas há mais de 40 anos antes dele nascer, como “A Palavra” (1955), de Carl Dreyer.

Quando pedimos para listar cinco filmes que marcaram sua vida, apenas um – “Gerry” (2002), de Gus van Sant – foi realizado quando Yuri já existia neste mundo. Seu conhecimento sobre filmes antigos, e raros no mercado brasileiro, diz muito sobre a cinefilia de sua geração. Uma paixão que nasceu primeiro em casa diante da tevê e do computador. “Um das minhas maiores experiências com filmes foi diante do computador”, revela. Só depois o fascínio cresceu em salas de cinema.

“Meu pai sempre gostou muito de cinema, e lembro de um momento marcante quando fomos à locadora e alugamos -Réquiem para Um Sonho-, -Laranja Mecânica-, -Magnólia-. Eu devia ter uns 12 anos e, enquanto víamos os filmes, meu pai fazia interrupções para perguntar o que eu achava, com o que concordava, ou não, e isso abriu muito a minha cabeça”, resgata.

A passagem da sala de estar para a sala de cinema aconteceu quando foi levado ao shopping para ver -Harry Potter e a Câmara Secreta- (2002). Heroi que Yuri já conhecia dos livros. “Hoje acontece o contrário. Quando há um filme que sei que é preciso ver numa sala de cinema, como -A Árvore da Vida-, sou eu em quem arrasta meus pais para ir”, conta sorrindo.

“Os espaços que são meus pilares são o Cinema da Fundação e o São Luiz, mas não sou xiíta. Vejo todo tipo de filme. O problema nos multiplex é que não temos paz. São lugares onde me sinto desrespeitado. Quero conhecer o Cineteatro do Parque, mas nunca tive a chance de ver um filme lá”, lamenta.

Apesar da infinidade de possibilidades que a Internet oferece ao jovem, Yuri cultiva uma interesse especial pelo cinema brasileiro, e em particular pelo pernambucano. “Dois fimes que espero ansioso é -Tatuagem-, de Hilton Lacerda, e -Doce Amianto- , do pessoal do Ceará”, adianta Para Yuri, mais do que a experiência de estar numa sala de cinema, ele percebe enriquecer sua cultura nos cineclubes. Frequentador assíduo do Cineclube Dissenso, ele próprio movimentou o município do Cabo de Santo Agostinho (a 35 quilômetros do Recife) criando o CineCínico. “Por meio destes encontros formei amigos e me forço a ver filmes que à princípio não escolheria. É bom porque, ao final da sessão, eu saio melhor dali. O cinema é como um espelho. O que ele te mostra te põe em xeque”, concluiu parafraseando Tarkovsky.

Texto e imagens reproduzidos do site: www cinemaescrito com

Tradição do cinema e a transformação do segmento audiovisual na capital

Publicação compartilhada do site IMIRANTE, de 26 de outubrode 2019 

Tradição do cinema e a transformação do segmento audiovisual na capital

Se antes havia prédios próprios específicos para a exibição de filmes, atualmente estes empreendimentos migraram para centros ou empreendimentos comerciais; antigos cinemas deixaram saudades para muitas pessoas

Por Thiago Bastos/O Estado

A partir das décadas de 1930 e 1940, na geração pós-Éden, novos cinemas foram sendo abertos por iniciativa de empreendedores e jovens aprendizes e em vários pontos de São Luís. Locais e nomes como Rivoli, Rialto, Monte Castelo, Passeio, Anil, Cassino, São Luiz e outros serviram como fontes de empreendimento por anos na capital. Até hoje, quem tem mais de 60 anos se lembra com carinho de momentos com amigos e familiares vividos em um desses ambientes.

Em 1939, o empreendedor libanês Moysés Tajra adquiriu o Cine São Luiz, que, posteriormente, virou Rialto (cujo prédio era instalado na Rua do Passeio, ao lado do Socorrão I). Além deste, abriu no mesmo ano o Cine Roxy, na Rua do Egito. Por fim, os Tajra empreenderam com o Cine Rival.

O Cine São Luiz concorria ainda à época com outras unidades, como Rex (no João Paulo, ao lado do atual comando do 24º Batalhão de Infantaria de Selva, do Exército), Olímpia e Éden. Em publicação do jornal “O Combate”, em 1945, era possível saber que às 16h era exibida a película “Ladrão que Rouba Ladrão”.

Já o Cine Roxy, pela sua localização, era um dos mais frequentados, até o fim da década de 1960. Tratava-se de um estabelecimento conhecido por trazer filmes considerados raros à época. Em 1948, começou a ser exibido no local o filme “Quan­do a neve tornar a cair”. A história demonstrava a sociedade russa e os feitos heróicos dessa população nas guerras.

Anos antes, em 1946, representantes do Partido Libertador reuniram-se no “Cine Roxy”, conforme publicação do Diário de S. Luiz, de 12 de julho de 1946. O encontro, de acordo com o periódico, contou com a presença de membros dos diretórios estadual e municipal da legenda, a fim de “tomarem deliberações importantes de caráter pú­blico”.

O Roxy, que anos mais tarde passou a ser conhecido pela exibição de filmes pornográficos, começou a empreitar na arte de produções para “acima dos 18 anos”, antes mesmo da década de 1950. Em 21 de junho de 1949, o cinema exibiu a partir das 22h o filme “Veneno lento”, voltado para um conflito amoroso que gerou um crime “qua­se perfeito”.

1950 e 1960: outros cinemas e a chegada dos Duailibe

Após o Roxy e Rialto, começaram a empreender outras famílias em busca de autopromoção e destaque à arte cinematográfica na capital maranhense. Uma delas foi a família Duailibe. Segundo reportagem de “O Combate”, publicada em 3 de julho de 1951, surgia a Empresa de Cinemas Duailibe Ltda. De acordo com a publicação, o empreendimento “nasceu para beneficiar o público da capital e do interior do estado”.

Ainda de acordo com a reportagem, foi no “alvorecer glorioso” de 2 de fevereiro de 1950 que “nasceu para a glória da cinematografia maranhense” a empresa. A iniciativa partiu de moços valorosos: Jamil Murad, José Abrão Duailibe, Nagib Abrão Duailibe, Jorge Abrão Duailibe, João Abrão Duailibe, Odessa Berniz Jorge e Odila Berniz Jorge.

O início do legado da família no ramo seria com o Cine Anil, que proporcionaria “momentos de intenso prazer à população anilense”. Em seguida, a partir da década de 1960, passou o grupo a se dedicar à entrega do Cine Monte Castelo.

Antes da constituição da empresa, os Duailibe administravam prédios próprios para o funcionamento dos “luxuosos” cinemas. De acordo com “O Combate”, foi o empreendimento dos Duailibe, que trouxe a tela filmes como: “Céu Sobre o Pântano”, “Belinda”, “As Duas Órfãs” e “Carnaval no Fogo”.

Em abril de 1951, a exibição de películas no Artur Azevedo também estava ligada aos Duailibe. Anúncio do período aponta que o “Cine-Teatro Arthur Azevedo” era apontado como o de melhor som e projeção da cidade. Filmes nacionais como “A Sombra da Outra” e norte-americanos (“Vontade Indômita”) foram exibidos.

Em agosto de 1962, o então governador do Maranhão, Matos Carvalho, entregou à cidade um dos cinemas mais emblemáticos e conhecidos pela juventude maranhense, em especial, nas décadas de 1970, 1980 e 1990. O Cine Passeio, situado na rua de mesmo no­me (ao lado do atual Palacete Gentil Braga), inaugurou os trabalhos com a exibição do filme “O Candelabro Italiano”, um clássico das telonas.

Apesar do apoio inicial do poder público, conforme expõe Abraão Duailibe – filho de Benedito Duailibe (neto de José Abrão Duailibe), dono do empreendimento –, o governo estadual chegou a pedir o teatro de volta. “Houve essa tentativa, mas conseguimos reverter. O intuito de abrir este ponto na região central é revitalizar essa área, e este objetivo foi atingido”, disse.

No auge, o Cine Passeio chegou a receber até 800 espectadores por sessão. Mas a falta de clientes, o desenvolvimento de novas tecnologias e, principalmente, o custo de indústria cinematográfica levaram à queda no faturamento. Segundo explicou Abraão Duailibe, do total de dividendos, 60% eram dos arrendatários das peças cinematográficas e apenas 40% era destinada à propriedade do cinema para o custeio de manutenção dos equipamentos, pagamento de funcionários e outras aplicações.

Grandes produções da década de 1980, como a trilogia “De Volta para o Futuro”, lotaram as salas do cinema e atraíram jovens e até adultos, em uma fase definida pelos proprietários como o auge do Cine Passeio. “A ausência de boa concorrência também neste período ajudou para a nossa consolidação”, afirmou. Outras produções como “Coração Valente”,

“O Paciente Inglês” e “Central do Brasil”, pós-1990, passaram pelas máquinas cinematográficas do Passeio.

Em agosto de 2005, após várias tentativas de venda do local, o Cine Passeio anunciou oficialmente o fechamento das atividades. O tema foi trazido à tona por O Estado em sua edição do dia 28 do referido mês e ano em reportagem intitulada “Passeio de portas fechadas”.

Segundo a reportagem, foram 43 anos de exibições até o fechamento. A última sessão contou com os filmes “O Filho do Máskara” e “Visões”. Segundo Abraão Duailibe, outro fator preponderante para o fechamento foi a falta de segurança. “Foi ficando uma área muito insegura, e não restou alternativa a não ser fechar”, disse o ex-proprietário.

Cine Monte Castelo: se estivesse “vivo”, completaria seis décadas em 2020

O início dos anos 1960 significou uma nova fase no cinema ludovicense. Se na primeira metade do século XX, a ideia era – além de entreter – usar a estrutura para fins políticos, na segunda metade do mesmo século a finalidade comercial era latente. A vontade era tanta que viabilizou ousadias no mercado empresarial. Uma delas foi a entrega de um cinema em um bairro considerado pacato e de “família”. Em 1960, é inaugurado o Cine Monte Castelo.

De acordo com o pesquisador Joaquim Aguiar, o Cine Monte Castelo foi construído em um terreno abandonado onde estava instalada uma barraca (de dona Rosa). A cidadã vendia café, lanche e comida para motoristas e cobradores.

A expectativa pelo novo empreendimento foi representada em “A Pacotilha”, edição de 1959 – um ano antes da entrega. Na coluna “A Voz da Ilha”, Merval Melo escreve que está “em fase de conclusão” o Cine Monte Castelo - de propriedade das empresas Duailibe. Foram investidos milhões de cruzeiros.

E de fato a estrutura chamava a atenção. Se atualmente, o prédio que abrigou o cinema está fechado e tomado por animais de rua, no dia da entrega, o público se impressionou com a beleza e luxo da estrutura. Com capacidade para receber mil pessoas, com camarotes laterais e ornamentos em estilo europeu, o cinema rapidamente caiu no gosto popular.

Clássicos da biografia de Charles Chaplin, Burt Lancaster, Kirk Douglas, John Wayne e Audrey Hepburn passaram no núcleo do bairro tradicional da Ilha. Houve quem pegasse aquele “busão”, na década de 1960, e descia no abrigo – que existe até hoje - em frente ao cinema só para pegar aquela matinê ou última exibição.

Já arrendatário de outros empreendimentos, como o Teatro São Luiz (Arthur Azevedo), a família Duailibe conseguiu manter o cinema no auge por praticamente três décadas. Na sala de exibição do antigo cinema, além de filmes, cantores famosos também se apresentaram. Quem não se lembra da apresentação, pela manhã, do ainda iniciante na carreira Roberto Carlos? Pois é, esse show aconteceu e, mesmo sem registros fotográficos, ainda está guardado na lembrança de quem viveu aquelas poucas horas com o futuro rei.

Começa a derrocada

Na década de 1990, com a concorrência e advento das vídeolocadoras (que alugavam filmes a preços acessíveis), os cinemas passaram a ter queda no faturamento. A elevação nas despesas cinematográficas (os rolos de filmes inflacionaram no período) contribuiu para a falência do Cine Monte Castelo.

Em 1992, a sociedade ludovicense percebeu a decadência, com o anúncio de que o empreendimento passaria a exibir somente filmes de sexo. “As grandes produções começaram a dar lugar a outros gêneros e a qualidade das fitas exibidas no Monte Castelo também foi diminuindo”, disse Abraão Duailibe, também gestor do imóvel.

A exibição de produções para quem tinha “acima dos 18 anos de idade” tocou o cinema até 1994. Segundo Abraão, “dava para pagar as despesas”. Só que os gastos ultrapassaram a renda em definitivo e o plano B foi alugar o espaço para outras finalidades.

O prédio onde funcionou o Cine Monte Castelo foi, antes do abandono, igreja evangélica e espaço para shows e apresentações culturais esporádicas. Sem uma agenda contínua, a solução foi o fechamen­to, em 1999. Até um ano antes, conforme trouxe O Estado em sua edição do dia 20 de dezembro, a ideia dos donos era ainda manter o cinema fixo. Mas não foi possível.

O “The End” do Cine Monte Castelo deixou órfãos os amantes do cinema e saudosos aqueles que passaram instantes agradáveis na sala de cinema histórica.

Grandes momentos do Cine Monte Castelo

Em 4 de fevereiro de 1962, o Jornal do Maranhão trouxe a seguinte informação: “Quem não pretende dançar neste domingo pode quebrar a rotina indo ao cinema”. Nesta data, o Cine Monte Castelo exibiu “O Ciclone”.

Em 14 de novembro de 1965, os alunos do Ginásio Monte Castelo promoveram uma matinal no Cine Monte Castelo, em benefício do grêmio cultural. Houve ainda, no período e no citado cinema, a exibição de “O Filho de Django”, que mostrava o suposto filho de Django em bravatas. Trata-se de uma obra italiana imprópria para 14 anos.

Celso Aquino dos Santos é o projetista mais antigo vivo na capital

O filho do projetista mais antigo da cidade conta ainda que, antes das máquinas cinematográficas mais avançadas, os equipamentos eram de carvão e, anos mais tarde, movidos por lâmpadas xenon de 3 mil volts. “Com o advento de outras tecnologias voltadas ao 4K, ninguém passou a perder mais tempo com uma tecnologia de exibição de filmes mais antiga”, disse Celso Filho. O fechamento dos antigos cinemas também propiciou o desaparecimento da figura do projetista. Uma antiga máquina ainda é preservada no Cine Praia Grande, mantido no Centro Histórico. Mesmo sem os rolos originais, Celso Filho demonstrou a O Estado o manuseio do recurso. “Este equipamento está em bom estado de conservação”, disse. Além das máquinas, havia as hastes para apoio dos filmes. “Era para voltar o rolo e exibir o filme novamente na próxima sessão”, disse. O trabalho do projetista era cansativo, mas essencial para o funcionamento dos antigos cinemas.

Texto e imagem reproduzidos do site: imirante com

domingo, 6 de outubro de 2024

O amor à vida e ao cinema no filme “Cinema Paradiso”

Artigo compartilhado do site PGL GAL, de 4 de Julho de 2012

O amor à vida e ao cinema no filme “Cinema Paradiso”

Por José Paz Rodrigues

 Não por acaso inicio a minha série sobre as aulas no cinema, no começo das férias do verão, com uma obra-mestra do cinema. Porque “Cinema Paradiso” é do ponto de vista formal, e de estética cinematográfica, assim como em conteúdos educativos tão profundos, relacionados com a vida, o amor e os valores humanos, um filme todo um clássico e, com o tempo que passa, uma fita maravilhosa.

Um filme tão autêntico e tão fantástico, realizado polo meu tocaio Giuseppe Tornatore, em 1988, que ninguém deveria perder de ver alguma vez. É pouco o tempo em que aparecem no filme aulas reais, em que os rapazes têm que suportar as ridículas técnicas didáticas de uma mestra hostil, reacionária e híper-autoritária, da vara e da repressão, para não atingir a aprendizagem que pretende no ensino do cálculo. Ou as aulas de exames para que os examinandos, rapazes e adultos, possam tirar o graduado escolar.

Aparecendo, portanto, pouco o espaço físico aula que todos conhecemos e entendemos, mas todo o filme é uma aula completa e extraordinária, ao longo dos seus 123 minutos. Onde os mestres são espontâneos, e não por isso deixam de ser magníficos: a mãe do protagonista, o padre, a sala de cinema com variados filmes dirigidos por grandes diretores (Ford, Chaplin, Renoir, Visconti, de Sica, Vardim, Rossellini, Fellini…) e, especialmente o projecionista, interpretado magistralmente por Noiret, que faz de verdadeiro pai de Totó (o seu morrera na guerra, nos campos russos) e lhe ensina a profissão, mas também a ser um homem com valores e princípios, como um grande educador que é, sem ele sabê-lo.

Por demais o filme, toda uma obra de arte, serve para aprender todos os recursos cinematográficos da linguagem fílmica, pois nele estão representados todos os tipos de planos, de panorâmicas, de uso do tempo e do espaço, dos movimentos de câmara de rotação e traslação, e de todas as possibilidades que oferece a expressão icónica. Se a isto lhe sumamos a infinidade de conteúdos, de mensagens, de valores, de aspetos humanos, morais, vitais e psicológicos que aparecem no percurso fílmico, nas diversas e variadas personagens, nos distintos lugares e momentos, nas frases e discursos, temos que dizer que estamos diante dum filme verdadeiramente sublime e poético, e, como educativo, completíssimo.

Ficha Técnica do Filme:

Título original: Nuovo Cinema Paradiso (em galego: Cinema Paradiso)

Diretor: Giuseppe Tornatore (Itália-França, 1988, 123 minutos, a cores)

Intérpretes: Philippe Noiret, Salvatore Cascio, Jacques Perrin, Brigitte Fosey, Antonella Attili, Marco Leonardi e Agnese Nano. Música de Ennio Morricone. Fotografia de Blasco Giurato.

Prémios: Óscar ao melhor filme estrangeiro em 1989. Globo de Ouro e Prémio especial do júri no Festival de Cannes do mesmo ano de 1989. Prémios especiais para os dous atores protagonistas.

Argumento: Nos anos que antecederam a chegada da televisão (logo depois do final da Segunda Guerra Mundial), numa pequena cidade da Sicília o rapaz Totó (Salvatore Cascio) ficou hipnotizado polo cinema local e procurou travar amizade com Alfredo (Philippe Noiret), o projecionista que se irritava com certa facilidade, mas paralelamente tinha um enorme coração. Todos estes acontecimentos chegam em forma de lembrança, quando agora Totó (Jacques Perrin) cresceu e se tornou um cineasta de sucesso, que se recorda da sua infância quando recebe a notícia de que Alfredo tinha falecido.

Análise do Filme:

Filmes como este são acontecimentos, e olhá-los, um privilégio. A visão nostálgica e melancólica do diretor/autor não só da arte cinematográfica, mas do próprio ritual de ir e estar no cinema, tornou-se clássica desde a sua primeira exibição. Não se fica alheio a Cinema Paradiso: o roteiro emocionado, que através da aparente simplicidade esconde uma farta riqueza de tipos e situações, recria toda a atmosfera de encantamento que os mais velhos um dia experimentaram, e de que a geração atual foi privada pola substituição das grandes salas luxuosamente decoradas polos impessoais cubículos instalados dentro de galerias.

Num tempo em que o público era ingénuo e a emoção causada polos filmes era novidade, não era ainda o cinema um passatempo qualquer. Era espetáculo, ao qual se aplaudia e polo qual se chorava, se ria e se deixava levar por tudo aquilo que ele então provocasse. Este filme não nos deixa esquecer o quanto é plural o cinema e seu público, e o quanto se misturam a emoção na tela com a da plateia. Nos momentos breves em que mostra casais formando-se, pessoas amadurecendo e, principalmente, os grandes olhares atentos às imagens na tela, com uma música bonita, Tornatore está dizendo-nos que cinema, como toda arte bem feita, é emoção, e está bem mais vinculada às nossas vidas do que supomos.

A trama simples, do menino pobre cujo pai morreu na guerra, difere pouco de outras onde o rito de passagem da infância para a vida adulta traz ao protagonista algo do qual ele jamais se esquecerá. Nesses filmes o que vale é a sensibilidade do diretor em descrever o tal rito de passagem, e Tornatore soube criar o ambiente ideal para desenvolvê-lo. Além da música de Morricone, preciosidade à qual pode-se ficar um dia inteiro elogiando, o diretor contou também com bela cenografia e direção de arte, responsáveis pela construção da deliciosa vila de Giancaldo e do seu cinema (que, na primeira fase, antes do incéndio, divide suas atividades com a igreja, aumentando ainda mais a mística do lugar). A riqueza nos detalhes fica evidente quando da passagem do tempo, e da estranheza, quase deceção, que as mudanças vão provocando.

O elenco de atores é o outro trunfo do cineasta. Mas não destacar o talento de Tornatore como narrador seria injusto. A elaboração na construção de imagens permite momentos como a sensível sequência da costura que vai desfazendo-se quando a mãe de Totó, ao final, vai receber o filho. Ou, ainda, a beleza escandalosa da imagem saindo do projetor e deslocando-se pola sala de Alfredo, até atingir, na rua, a frente de um prédio.

Aspetos para refletir:

– Importância do cinema como veículo educativo, para apreender a linguagem cinematográfica, aspeto básico para poder valorar os filmes com valores artísticos e de bons conteúdos.

– Comentar o valor real dos currículos ocultos: os mestres espontâneos fundamentais, o papel dos pais, a necessidade de ser amados, o apreço pola vida, o tempo perdido, a nostalgia ou morrinha, o sorriso e os choros, a figura materna, o amor em todos os tempos e âmbitos, a constância no trabalho e as motivações positivas a aquisição de valores positivos de forma inconsciente, observando a conduta dos mais velhos.

– Comentar o conteúdo da mensagem tagoreana que o “Mestre de vida”, Alfredo, lhe dá a Totó: “Tudo quanto faças deves fazê-lo sempre com amor”.

As Aulas no Cinema

FILME > The projecionist





 Título original: El proyeccionista

Título em inglês: The projecionist

País: República Dominicana

Duração: 1 h e 34 min

Gêneros: Drama, mistério, thriller

Diretor: José Maria Cabral

Sinopse: Eliseo, um homem solitário que opera um projetor de filmes, encontra seu único consolo em uma mulher desconhecida que vê em um rolo de filme. Depois que o carretel é destruído em um acidente e ele encontra outros rolos, Eliseo decide encontrar a mulher nos lugares mais remotos e pobres da República Dominicana.

QUANDO O CELULÓIDE REVELA A VERDADE.

Mais uma vez volto a ressaltar o quão gratificante é “garimpar” filmes de todo o mundo, e a lista de submissões para o Oscar de Melhor Filme Internacional é uma ótima mina de pérolas da sétima arte, pois, espera-se que cada país envie o que tem de melhor no ano de referência. O filme em destaque vem da República Dominicana, um país que muita gente não sabe nem que existe, e representou o país no Oscar 2020. Trata-se de uma obra que homenageia o cinema de uma forma já vista em outras obras como “O homem das estrelas” (1995), “Cinema Paradiso” (1988), entre outras, evidenciando o amor por essa arte tão especial, e, no caso específico do filme em tela, fazendo com que o protagonista simplesmente ame o intangível, notabilizando o poder que uma simples imagem advinda de um projetor, mesmo antigo, possui.

Ao continuar o ofício de seu falecido pai, Eliseo sai de cidade em cidade nos rincões da República Dominicana projetando filmes para a alegria das populações de tais localidades – e tudo isso é feito à moda antiga, com equipamentos obsoletos e infraestrutura precária. Em determinado momento, ele é apresentado à modernidade do cinema, mas refuta prontamente, delineando um direcionamento nostálgico e romântico que o filme apresenta em relação à arte chamada cinema. Quanto a esse tópico, não se pode deixar de ressaltar que o filme não se furta de promover aquele velho embate entre o cinema tradicional e a evolução tecnológica – mesmo apresentando riscos já ultrapassados, como a TV, por exemplo, pela condição social que o país apresenta – que tanto prejudica a continuidade das salas de exibição de todo o mundo hoje em dia. Nesse sentido, a cena em que Eliseo provoca uma queda de energia na cidade, para que os moradores deixem de assistir TV e vão à sua exibição em praça pública, é hilária e muito especial.

Mas não só de homenagens à sétima arte e temáticas correlatas vive o filme, senão seria apenas mais do mesmo. “O projecionista” possui uma narrativa intrigante desde o início, pois apresenta seu protagonista interagindo de forma obsessiva com gravações antigas descobertas dentre as coisas de seu pai – mais especificamente com uma mulher que nunca viu pessoalmente em toda a sua vida, e pela qual aparentemente cultiva profundo amor. A curiosidade automaticamente vem à tona e várias elucubrações vêm à mente do espectador após a apresentação desse ponto de partida, inclusive algum tipo de loucura que Eliseo porventura possa ter. Esse é o fio condutor da história, pois, em determinado momento, após a descoberta de novos rolos de filme, ele volta as atenções para procurar a misteriosa mulher novamente pelo país – algo que ele já tinha feito há muito tempo. Assim, vários aspectos concernentes à família tomam corpo, resultando em uma reviravolta espetacular no desfecho do filme, que deixa até o desejo de ter havido um desenvolvimento mais aprofundado das situações reveladas, pois, ao fim, resta a necessidade de algum grau de interpretação, principalmente no tocante aos sentimentos vivenciados pelo protagonista. De qualquer forma, há aspectos simbólicos que embelezam bastante a experiência proporcionada, mesmo ante a bomba atômica que a narrativa lança mão.

Outra personagem interessante que o filme trabalha é a jovem Rubi, que acaba embarcando na jornada de Eliseo para fugir de sua realidade difícil. Ele concede muito vigor ao filme, por seu comportamento proativo, contestador e desafiador, fazendo um contraponto ao ranzinza e solitário Eliseo, que prefere continuar “tocando o intangível” e levar a vida no automático, de forma até melancólica. O espectador mais atento notará que, a partir da curiosidade da moça, que resulta em um comentário aparentemente despretensioso, o filme dá pistas importantes sobre o que acontecerá em seu desfecho, e, a partir de algumas de suas ações, o protagonista abre os olhos para nuances importantes dentro da narrativa. É uma personagem muito importante!

Através de seu filme, José Maria Cabral, diretor do primeiro filme dominicano a “rodar” em festivais pelo mundo, “Carpinteros” (2017), consegue alcançar vários objetivos: continuar sua carreira promissora; introduzir mais uma vez seu país no mapa da sétima arte a nível mundial através da qualidade de sua película; homenagear o cinema e desenvolver um roteiro surpreendente. “O projecionista” não é uma obra-prima, mas é um filme que merece ser visto com olhos admirados.

sexta-feira, 4 de outubro de 2024

Filmes: Joker e Interstellar, em películas de 70mm.


Fotos reproduzidas do Facebook/Parkway Cinema Barnsley.

Primeira projeção pública de cinema, França 28 de dezembro de 1895

Fotograma do primeiro filme dos irmãos Lumière, “La Sortie de l’usine Lumière à Lyon”
 (A Saída da Fábrica Lumière em Lyon).

Legenda da imagem: Émile Reynaud projetando o desenho “Pauvre Pierrot” em seu Teatro Ótico, em 1892. São as primeiras projeções animadas em uma tela, diante de uma plateia reunida, três anos antes das exibições dos irmãos Lumière no Grand Café (1895). Gravura de Louis Poyet .

Artigo compartilhado do site  ENSINAR HISTÓRIA 

Primeira projeção pública de cinema, França 28 de dezembro de 1895 

Em 28 de dezembro de 1895, os irmãos Auguste e Louis Lumière fizeram a primeira projeção pública de cinema, no Teatro Eden (que ainda existe), em La Ciotat, no sudoeste da França. O filme de 40 minutos de duração mostrava a chegada do trem à estação Ciotat e o embarque e desembarque de passageiros. Logo em seguida, o filme L’Arrivée d’un Train à la Ciotat foi apresentado no Grand Café de Paris, com entradas pagas – 1 franco – e um programa de 10 filmes curtos, de 3 a 4 minutos. O evento causou comoção nos trinta e poucos visitantes vieram presenciar o momento histórico da primeira sessão cinematográfica comercial do mundo. Os organizadores da apresentação eram os irmãos Auguste e Louis Jean Lumière – hoje considerados os inventores do cinema, embora antes deles outros já tivessem apresentado o cinema ao público. A sessão de cinema no Grand Café de Paris foi inaugurada com o filme Sortie de l’usine Lumière à Lyon (veja mais abaixo). Fotograma do primeiro filme dos irmãos Lumière, “La Sortie de l’usine Lumière à Lyon” (A Saída da Fábrica Lumière em Lyon). O projetor – chamado cinematógrafo – era um aparelho movido manualmente por uma manivela e com 3 funções: filmar, revelar e projetar. Era portátil (pesava menos de 5 kg) e não usava eletricidade. Essa versatilidade foi uma das características que ajudaram a difundir rapidamente o cinema em todos lugares. O êxito do cinema foi imediato na França e em toda a Europa e América do Norte. Em um ano, os irmãos Lumière criaram mais de 500 filmes, marcados pela ausência de atores e ornamentos naturais, a brevidade, a ausência de montagem e a posição fixa da câmara. O desenvolvimento de novas técnicas cinematográficas, de uma maior narrativa e dos primeiros roteiros de ficção por outros cineastas pioneiros (entre eles, Georges Mèliès que trouxe a fantasia para as telas) deram impulso definitivo ao cinema – inovações que não foram absorvidas pelos irmãos Lumière. Uma invenção com muitos inventores Embora os irmãos Lumière não tenham reivindicado para si a invenção do cinema, eles foram reconhecidos como pioneiros pela opinião pública. Auguste e Louis eram filhos e empregados do fotógrafo e fabricante de películas Antoine Lumière, dono da Fábrica Lumiére, em Lyon. Ao se aposentar, Antoine deixou a fábrica para os filhos, incluindo seu cinematógrafo, uma máquina de filmar e projetar. O invento do cinema é atribuído a León Bouly que, em 1892, que requereu a patente de um dispositivo capaz de captar e projetar imagens em movimento chamando-o de Cynématographe Léon Bouly. Em 27 de dezembro de 1893, ele encurtou o nome do aparelho para cinématographe. O cinematógrafo foi registrado como sendo uma “câmera instantânea para a obtenção automática e sem interrupção de uma série de negativos de análise de movimentos“. Em 1894, Bouly não pode pagar pelo direito de suas patentes e o nome cinématographe ficou disponível, sendo patenteado pelos irmãos Lumière em 1895. Hoje, é consenso entre os especialistas de que Léon Bouly foi, antes dos irmãos Lumière, o verdadeiro inventor original do termo cinématographe. A primeira exibição pública de imagens em movimento é creditada, pelos estudiosos, ao francês Émile Reynaud, contemporâneo dos irmãos Lumiére. No dia 28 de outubro de 1892, Reymaud reuniu um público pagante em uma sala escura do Museu Grévin e realizou a primeira projeção animada em tela grande. Eram desenhos animados que ele chamou de Pantomimas Luminosas acompanhados por uma música de Gaston Paulin, especialmente composta para a exibição (primeira trilha sonora). Émile Reynaud projetando o desenho “Pauvre Pierrot” em seu Teatro Ótico, em 1892. São as primeiras projeções animadas em uma tela, diante de uma plateia reunida, três anos antes das exibições dos irmãos Lumière no Grand Café (1895). Gravura de Louis Poyet . Os Estados Unidos também reivindicam a invenção do cinema atribuindo-o ao inventor Thomas Edison. Este patenteou em 24 de agosto de 1891, o cinestocópio: uma câmera que usava filme perfurado de 35  mm e sistema de alimentação intermitente de filme por roda dentada. O filme era visto individualmente por cada espectador, através de uma janela que funcionava como visor, instalada em uma das paredes do equipamento. Apesar da invenção ter sido registrada em nome de Edison (e assim permanece até hoje), ela na verdade foi feita por William Dickson, um escocês que trabalhava para Thomas Edison que o encarregou de criar o cinestocópio . As polêmicas em torno da autoria da invenção evidenciam que o cinema não pareceu milagrosamente em 1895, mas é o resultado de práticas e inventos anteriores  desenvolvidos a partir da invenção da câmera e do filme fotográfico. O filme projetado pelos irmãos Lumière em 1895 O início do cinema no Brasil Embora não haja registro oficial, acredita-se que o primeiro filme feito no Brasil tenha sido uma tomada de menos de 1 minuto da Baía de Guanabara, realizada pelo imigrante italiano Afonso Segretto, em 1898. O primeiro longa-metragem de ficção brasileiros viria em 1908, pelas mãos de Antônio Leal. Com 40 minutos de duração, a película era baseada em um crime ocorrido dois anos antes, que havia causado grande comoção na opinião pública. A encenação mostrava dois assassinatos (um na praia e outro, seguido de roubo, em uma joalheria), a investigação dos casos e, ao final, os bandidos na cadeia. As famílias das vítimas tentaram impedir a exibição, mas o filme foi um sucesso, sendo visto por mais de 20 mil pessoas em seu mês de estreia.

fonte: ensinarhistoria com br

Blog: Ensinar História - Joelza Ester Domingues

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