segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Como quis Méliès

Funcionário do Kinoplex em São José. 
Foto: Carol Tomba.

Como quis Méliès

A arte de fazer cinema - As luzes se apagam, o projetor funciona e a magia acontece: vida longa ao analógico!

Isabella Rabelo
São José dos Campos

A sala de cinema abre as portas. O público chega e se acomoda em suas cadeiras confortáveis, com sacos de pipoca e refrigerantes em mãos. Quando as luzes da sala se apagam, uma outra, vinda de uma pequena janelinha, se acende: ela vem da cabine de projeção, onde se combinam imagens, sons e movimentos em grandes rolos de filmes, que, somados à muita técnica, fazem toda a magia do cinema acontecer.

Logo a sessão se inicia e o encantamento do cinema entretém de tal forma que as pessoas não imaginam que logo acima há pessoas trabalhando para que as imagens sejam projetadas perfeitamente na telona. Este é o trabalho dos operadores de projeção, responsáveis por fazer muito mais que apenas apertar o play na hora da sessão.
Os filmes chegam das produtoras separados em sacos pesados -- dentro de até nove latas -- e precisam ter suas partes emendadas para formar um grande rolo, que se transforma, enfim, em um filme.

O operador do Kinoplex Vale Sul, Paulo Silvério, trabalha na área há quatro anos e explica que esse serviço requer muita atenção e destreza para que o som de uma bela explosão não se perca em vaias do público insatisfeito com algum problema técnico.
Cuidadosamente, Paulo explica como funciona o processo: o primeiro passo é o enquadramento do filme para que a imagem não saia distorcida. “Ninguém quer ver uma pessoa com a cabeça no lugar dos pés, não é?”, comenta ele.

Depois, é feito o corte na película, para emendar uma com a outra e dar a sequência correta do filme. Em seguida, terminada a colagem, enquanto está passando o rolo para a bobina do projetor, ele olha no relógio e se lembra que está na hora de soltar o play de um filme que teria de começar. “Ih, tá na hora, espera um minuto.” Corre para o projetor, aperta o botão, e logo retorna para continuar o processo. Logo depois, ele explica que essa montagem ocorre em dias de estreia, que geralmente ocorrem às quintas ou sextas.

Enquanto a fita passa lentamente para a bobina, com mais calma e mãos ainda trêmulas, Paulo explica: “esses aros pesam, no mínimo, 20 quilos. Depois de tudo pronto, temos que levantá-lo e levá-lo para o projetor, o que explica porque não tem mulheres trabalhando aqui, precisa ter muita força”. Mas, oposto a isso, é necessário também ter delicadeza, pois qualquer deslize irá refletir na qualidade da imagem exibida.

Saudosismo. Segundo o diretor de tecnologia do Cinemark, Luciano Silva, a maior diferença entre a exibição analógica e a digital se deve ao envelhecimento.

Enquanto o HD tem uma vida útil bastante longa, o rolo de filme vai se desgastando com o uso. Luciano acrescenta ainda que, além disso, é um trabalho manual, em que podem haver falhas. Mas o operador diz que se o trabalho for feito corretamente, o público não consegue perceber se está assistindo a um filme digital ou não, pois só quem trabalha com isso consegue enxergar alguns sinais que piscam rapidamente na tela.

O problema de se exibir filmes dessa forma, porém, é encontrar quem saiba executar o trabalho que Paulo faz, de operador. O Espaço Cultural Cine Santana, em São José dos Campos, possui três projetores de cinema para filmes 35 mm que não são utilizados. Desde 2011, não há quem os opere, embora existam 500 filmes de mestres como Mazzaropi esperando para serem exibidos. Edilaine Pereira, coordenadora do espaço, diz que a FCCR estuda novos projetos na área de audiovisual para que os equipamentos possam ser utilizados.

Mas ainda que haja um certo saudosismo em relação aos filmes cinematográficos, não há quem discorde que a tendência é a digitalização. “Os Estados Unidos e a Europa, por exemplo, têm quase todo o mercado digitalizado. Estamos vivendo uma das maiores transformações que o mercado de exibição já passou, é um caminho sem volta”, comenta Luciano.

O operador disse que no Kinoplex Vale Sul duas salas já são digitais. No Brasil, ainda não há demanda suficiente para que todos os cinemas sejam totalmente digitalizados.

Com um olhar cabisbaixo, voltado para o projetor, ele diz que o acha mais charmoso e bonito e até o barulho que faz é mais agradável.

Por fim, completa: “Eu acredito que dá para manter o cinema com rolos de filmes e tudo mais, de forma que, com o tempo, ele se transforme em uma coisa clássica, como carros ou músicas”.

Foto e texto reproduzidos do site: 
ovale.com.br/viver/como-quis-melies-1.435664

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