quarta-feira, 30 de julho de 2014

O fim da fita


Publicado originalmente no Jornal ZH, em 02/12/2012

O fim da fita

Depois de mais de cem anos de serviços prestados, película de 35mm sai de cena
Reviravolta tecnológica consolida-se com a alta qualidade do suporte digital

por Marcelo Perrone.

A resistência foi brava. Na ativa desde que os irmãos Lumière rodaram a manivela de seu cinematógrafo, em 1895, o filme 35mm começa a se despedir do papel de protagonista na história do cinema.

Com o suporte digital finalmente à altura da qualidade do registro em película, consolida-se mais uma reviravolta tecnológica, que agora envolve todas as etapas da realização de um, veja só, ainda chamado filme: da captação da imagem à exibição nos cinemas.

Nos Estados Unidos, a previsão é de que em 2013 toda a rede de exibição comercial esteja digitalizada. No Brasil, apenas 20% das 2.352 salas estão digitalizadas no parâmetro estabelecido pela DCI (Digital Cinema Initiatives), comissão formada pelos grandes estúdios de Hollywood que, em 2005, firmou os padrões técnicos do cinema digital. Grandes redes exibidoras do país, porém, já exibem índices superiores a 30%. O avanço digital foi possível também pela superação de entraves burocráticos, como definir quem paga por essa transição. Foi criado o modelo de financiamento chamado VPF (Virtual Print Fee, ou “taxa de cópia virtual”), um “racha” que envolve estúdios, distribuidores e exibidores.

A digitalização do circuito no Brasil conta com apoio do governo federal, que, via Fundo Setorial do Audiovisual e BNDES, financiará a maior parte dos investimentos das empresas nacionais em equipamentos DCI. Em 2012 também foi reduzida em 30% a carga tributária para importação do sistema de projeção DCI. Uma sala neste padrão, que possibilita ainda a exibição 3D, tem custo de
R$ 400 a R$ 500 mil.

– Esse apoio fará a digitalização deslanchar em 2013 – diz Flávio Panzenhagen, presidente do Sindicato das Empresas Exibidoras Cinematográficas do RS e dono de salas em Santo Ângelo. – Desde junho, só opero com o DCI. Pude estrear filmes como Amanhecer junto com todas as capitais. Antes, teria de espera mais de quatro semanas para receber uma cópia em película.

A cópia em 35mm tem custo superior a US$ 1 mil e exige uma complexa logística para levar as latas com o filme ao exibidor e, depois, retorná-las ao distribuidor. A cópia digital, por cerca de US$ 200, circula num HD (disco rígido), que é acoplado ao equipamento DCI, com o arquivo criptografado, e pode ser reutilizado. Além de proteger contra a pirataria, a criptografia garante que a projeção naquele equipamento será dentro dos padrões de qualidade pré-definidos.

O desempenho de Amanhecer – Parte 2 ilustra esse novo tempo. Um terço das 1,2 mil salas que exibem o filme no Brasil o fazem em formato digital. O lançamento maciço atingiu praças periféricas e ajudou o filme a ser visto, em duas semanas, por 7 milhões de espectadores.

– A partir de 2013, essa entrega deve ser feita via satélite. O HD também pode ter problemas logísticos, pois depende de transporte, de aeroporto – diz Jorge Assumpção, gerente de programação da Paris Filmes, distribuidora de Amanhecer.

Segundo Assumpção, em alguns lançamentos, como a comédia nacional De Pernas pro Ar 2, dia 28 de setembro, a Paris fará cópias digitais para também atender salas que ainda operam os sistemas Auwe e Mobz, que popularizaram a exibição digital no país de forma controversa – os cinéfilos mais exigentes torcem o nariz para a qualidade inferior deste modelo de projeção.

Em tempos passados, o espectador gritava e vaiava diante de um vacilo do projecionista com o foco ou a troca de rolo. Agora, esse espectador precisa reeducar o olhar, um tanto destreinado pela diversidade de estímulos visuais, para voltar a valorizar uma projeção de qualidade – garantia asssumida pela nova era do cinema digital.

Digitalização no mundo

Percentual de salas com equipamento de projeção no padrão DCI, homologado pelos grandes estúdios:

> 70% nos EUA
> 60% na Europa
> 100% na Noruega e em Hong Kong
> 22% no Brasil (35% nas redes Cinemark, Cinépolis e Araújo)

Fonte: Filme B e Luiz Gonzaga de Luca, especialista em tecnologia do setor cinematográfico

Vampiros digitais

Como base no grande sucesso e nos recordes batidos pelo desfecho da saga Crepúsculo, pode-se observar a evolução da projeção digital no Brasil:

Amanhecer – Parte 2 (2012) foi lançado em 1.223 salas, 400 delas com exibição digital

Amanhecer – Parte 1 (2011) foi lançado em 1.100 salas, 150 delas com exibição digital

Fonte: Paris Filmes.

Filme 35mm começa a se despedir do papel de protagonista na história do cinema
Foto: Ricardo Wolffenbüttel / Agencia RBS

Texto e Imagem reproduzidos do site: zh.clicrbs.com.br

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