sábado, 19 de novembro de 2016

Bastidores do Cinema

Projecionista conferindo chegada de filme completo, 
dividido por partes,  em rolos e dentro de latas. (Foto de Carlo Cerchioli).
Imagem postada por MD, para simples ilustração de artigo.

Publicado originalmente no site GCN, em 10/06/2009.

Bastidores do cinema
Por Fernanda Martins.

Pegar um cineminha no fim de semana, acompanhado ou até mesmo sozinho, é uma prática comum em Franca. O que muita gente não imagina é que a projeção dos filmes na telona não é tão simples como alugar um filme e assistir no aparelho DVD em casa. A cada sessão, enquanto os cinéfilos compram ingressos, pipocas e guloseimas, o projecionista está a mil por hora nos corredores que ligam as três salas da Moviecom, instaladas no Franca Shopping. Desde 28 de dezembro de 1895, em Paris, quando os irmãos Lumière fizeram uma apresentação pública do cinematógrafo, a sétima arte caiu no gosto popular, mas pouca coisa mudou desde a invenção do cinema. Quem pensa que o filme é igual ao DVD está enganado. Transportadas divididas em latas (que pesam em média 2 quilos cada), as películas enroladas são cuidadosamente manuseadas pelo projecionista José Viumar da Silva, de 35 anos. 

O trabalho dele começa quando os filmes chegam, às vezes horas antes da estreia, na sexta-feira. Na máquina de montagem José Viumar emenda os trailers e filmes - feitos em películas de 35 mm, com imagens dispostas em frames (ou fotogramas) - em fita especial que resiste ao calor do projetor. "Cada 40 frames equivalem a um segundo de imagem. A linha azul à margem da película é o som, por isso tenho que prestar bastante atenção na hora de montar para não trocar os lados", ressalta Viumar. O primeiro filme com som totalmente sincronizado foi lançado em 1928: The Lights of New York, da Warner. Recentemente, o Cine 1 recebeu um sistema de som digital de última geração. Em seguida, o filme (montado num prato) vai para a máquina de automação composta por três pratos. Através das roldanas, ele passa pelo projetor e retorna a outro prato, ficando pronto para a próxima sessão. José Viumar faz questão de ressaltar que a máquina de projeção tem uma lâmpada Xenon poderosa. "Essa luz é tão forte, que se olhar diretamente nela a gente pode ficar cego", orienta. As lentes também são trocadas. "Os filmes podem ser em plano ou scope (tela cheia). Para projetar de acordo com a filmagem, utilizo uma lente própria para cada tipo", explica. Com a ajuda de auxiliar, José Viumar dá conta do recado e ainda arruma tempo para uma espiadinha, num lugar privilegiado: uma cadeira com almofada ao lado de cada janela. 

A gerente da Moviecom de Franca, Michela de Oliveira, argumenta que para atender ao anseio dos cinéfilos brasileiros em ver os filmes recém-lançados, as distribuidoras fazem rodízio dos longas entre as praças. "São mais de 1.900 salas de cinema no País e infelizmente as produtoras liberam poucas cópias. Por isso, nem sempre os longas estreiam simultaneamente na capital e em Franca", rebate, alegando que também são as distribuidoras que escolhem as salas que vão receber os filmes legendados ou dublados. Por causa desta rotatividade, o trabalho de José Viumar é sempre dobrado. Depois de fazer o processo para "emendar" os filmes, quando eles saem de cartaz, o projecionista precisa desmontar tudo de novo, encaixotar e mandar para outra praça. Simples. Nem tanto quando o projecionista anterior não é cuidadoso e inverte as partes dos filmes, trocando as caixas. "Às vezes os filmes chegam, por exemplo, em 10 partes e na lata quatro vem a parte oito. Por isso, depois que emendo preciso assistir e conferir. Dá trabalho porque é a primeira vez que vou ver o filme e preciso perceber se ele está na sequência. Assim, preciso revisar o trabalho para ver se a qualidade de imagem e som ficou boa", conta. Outro problema que José Viumar enfrenta, é que como os filmes vêm de outras praças em avião ou ônibus, geralmente chegam um dia antes da estreia ou até mesmo na manhã de sexta-feira, em cima da hora. Com certeza alguém que está lendo esta matéria já passou raiva no cinema um dia quando o filme parou de rodar de repente. José Viumar explica que isso acontece quando falta energia ou quando a fita arrebenta. "Nesse caso, infelizmente preciso cortar a fita, mas cinco metros equivalem a apenas seis segundos de filme, então o corte fica imperceptível", revela. 

Pelo trabalho de projecionista José Viumar recebe dois salários, com uma carga horária de seis horas diárias. O cearense se diverte no interior das salas de projeções e tem muitas histórias para contar. "Um dia durante a sessão flagrei um casal no maior `rala-e-rola`. Então chamei os funcionários e abrimos a janela (da projeção). Aí eles perceberam", lembra. José Viumar recorda que aprendeu a profissão aos 22 anos com Renan Gomes, projecionista dos antigos cinemas francanos São Luis, Odeon e Bristol. O primeiro filme que ele montou foi A Rocha (1996), de Michael Bay. Um filme que marcou o projecionista foi Titanic, que ficou quase três meses em cartaz no cinema. Faltaram exatamente "quatro dias para completar três meses", segundo Viumar. "Foi um sucesso de bilheteria. Até hoje eu não vi um público maior. As filas não acabavam", recorda. Mas o que chama mais atenção dele são os desenhos. A expectativa agora é para a estreia de A Era do Gelo 3, prevista para 1º de julho. Há 12 anos trabalhando no cinema do Franca Shopping, recentemente ele foi visitar os parentes no Ceará, mas não via a hora de voltar. "Acostumei com a sala, nem escuto o barulho (do filme rodando entre o prato e o projetor). Moro no cinema e adoro", conclui.

Texto reproduzido do site: gcn.net.br/noticias

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