terça-feira, 29 de julho de 2014

Na cabine de projeção do Cine Ouro




 Léo: “o cara que mexe com os negativos do cinema”.


 Sabe de que ano é este equipamento? De 1937!

Está achando que a cabine de projeção é silenciosa? Então espere até que tudo seja ligado!


Na cabine de projeção do Cine Ouro
Por Natânia Carvalho.


A maioria de nós sabe da existência do projecionista de cinema. Me lembro de quando era criança e perguntei para um amigo quem dava play na fita do cinema. Isso porque a cidade em que eu morava, Caldas Novas, acabara de ganhar um cinema depois de muitos anos sem nenhum e eu só havia ido a tal salinha escura com meu tio, que morava em Goiânia.

É claro que meu colega me deu um sonoro “dããããã ” e me explicou que no cinema não tinha VHS e que tudo era igual um negativo de máquina fotográfica. Com sete anos de idade a explicação me pareceu lógica e eu transformei o projecionista “no cara que mexe com os negativos do cinema”.

A segunda vez, em muito tempo, que eu pensei na figura do projecionista eu já fazia ensino médio. Estava no Cine Ouro, em uma sessão em que só havia eu. Entrei na sala, escolhi meu lugar e fiquei escutando a música que eles tocam antes de começar o filme. Olhei para os lados e… bem… ninguém. O cinema só para mim! Pensei.

Mas espera: havia o projecionista! E, sem mais ou menos, uma ideia de quem assistiu muita televisão nos anos 90 – e suas eternas repetições de filmes com animais gigantes atacando as pessoas- surgiu assim que a música cessou e as luzes se apagaram: e se o projecionista pular de onde está, me matar e esconder meu corpo na cabine?!

Sim, provavelmente é você que está gritando “dãããã” para mim agora. E não, o projecionista não me matou (ou sim… buuuu!). Mas isso fez com que eu me interessasse por essa figura. Você já pensou sobre a profissão? Bem, aqui embaixo você vai poder conhecer mais sobre ela através do Léo (estejam todos à vontade para chamá-lo pelo apelido, pois foi ele quem liberou, hein), projecionista do Cine Ouro.

Léo já foi filho de dono de cinema, quando mais velho morou dois anos em cinemas do interior – e em um deles literalmente dormia na cabine – e é um apaixonado pela sétima arte. Hoje, com nove anos de casa, ele conta suas experiências na entrevista abaixo e define sua profissão como hilária.

Natânia Carvalho: Como você começou na profissão?

Léo: Como é que eu comecei na profissão… Na verdade começou há muitos anos, sem nem eu saber… Meu pai era proprietário de um cinema [Cine Teatro Bagdá, em Rio Verde], aí indiretamente eu acabava ajudando seja levando filme ou na bombonière. Passaram-se os anos, o cinema fechou e eu só tive contato com isso indiretamente. Depois de uns vinte anos o cinema entrou na minha vida de novo.

NC: Há quanto tempo você está aqui no Cine Goiânia Ouro?

L: Eu entrei em 2004, então já são nove anos.

NC: E, pessoalmente, qual a sua relação com o cinema?

L: Eu gosto muito de cinema. Hoje mesmo preciso devolver um filme que peguei. “O voo”, com o Denzel Washington.

NC: Devolver? Então você loca filmes? Não é tão comum hoje em dia…

L: Eu prefiro ir na locadora alugar um filme original do que comprar um pirata. E hoje em dia chega tão rápido, não? Eu não sei te falar o ano especifico, mas me lembro que o filme saia do cinema e para chegar na locadora, ainda em VHS, demorava dois anos, três anos… Hoje é questão de três meses.

NC: E sua relação com o cinema mudou depois que você veio trabalhar no Cine Goiânia Ouro?

L: Um pouco… Eu sempre gostei de cinema, quando eu era mais novo eu assistia dois filmes por dia. Mas eles eram mais hollywoodianos. Eu cresci com Hollywood, na verdade. Aqui a gente exibe filmes culturais, então a gente aprende a diferença dos filmes culturais americanos para os europeus, por exemplo… É outra história.

NC: Você tem ideia de quantos filmes você já assistiu na vida?

L: Não… Uma vez (risos), a minha esposa foi marcar quantos filmes eu estava assistindo e tentar calcular quantos eu já havia visto. Aí, ela desistiu (risos). “Vou parar com isso”, ela me disse (risos).

NC: E durante as sessões, Léo, você já chorou dentro da cabine por causa de um filme muito emocionante ou odiou um longa que estava projetando?

L: Já! Já demais! Já chorei… Você está assistindo o filme, então você fica imerso nele. Agora a questão do ódio (risos), bem de vez em quando isso acontece. Mas aí você tem que entender que cada filme tem uma coisa que quer passar e um público que vem ver. Esses dias pra trás estava passando um documentário, esse filme é para quem gosta do assunto, aí é agradável.

NC: Tem alguma sessão que você considere mais especial?

L: Teve um evento aqui de dança e eles estavam mostrando uma dança debaixo da Torre Eiffel e o pessoal estava conversando sobre ela especificamente. De lá da cabine eu fiz sinal e fui lá falar sobre a imagem. Ela estava perfeita. As tomadas, a posição da câmera…

NC: Como é que você descreve, para alguém que não tem ideia do que é sua profissão, o que é ser projecionista?

L: É uma coisa hilária. Como assim hilária? Eu vou te explicar. Quando a gente chega em uma loja e vai fazer um crediário, aí as pessoas perguntam a profissão, eu respondo projecionista. As pessoas olham e perguntam: “mexe com projeto?” (risos). Eu sempre digo que quando elas vão ao cinema e sentam na cadeira tem uma pessoa lá em cima organizando o equipamento, essa pessoa sou eu. Aí as pessoas falam “aaah” (risos).

NC: Léo, como é a sua rotina de trabalho?

L: Chego, confiro o equipamento para ver se está nas especificações que a gente costuma trabalhar, confiro o filme que eu vou projetar. Olho janela, olho áudio, alguns pedaços do filme também e depois é aguardar o momento de começar a sessão.

NC: E quais têm sido as dificuldades e, também, as coisas boas da ser projecionista?

L: Bom, dificuldade… Às vezes falta equipamento necessário, o que dificulta o nosso trabalho. Mas as coisas boas, bem, é quando as pessoas saem comentando o filme, quando tem sessão com crianças e a meninada bate palma, depois que termina o filme você vê que as pessoas estão uma conversando com a outra sobre aquilo… Isso é muito gostoso.

Fotos e texto reproduzidos do blog: cinemacompequi.wordpress.com

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