terça-feira, 11 de abril de 2017

Relíquia: Cinema Paradiso na Serra

Foto: Sergio Jr./Agencia JB

Publicado em 14 de Março de 2008.

Um pequeno Metro.
Por Mariana Filgueiras.

O texto abaixo foi publicado no Jornal do Brasil em 4 de dezembro de 2005. Motivada pela campanha da Revista Moviola, Fotografe o seu cinema antes que ele vire uma igreja, a jornalista Mariana Filgueiras enviou a reportagem sobre o Centímetro, cópia do Metro Tijuca, demolido em 1977. A Foto é de Sergio Jr/Agencia JB. Veja como são as coisas. Uns viram igrejas, uns são demolidos. Outros renascem.

Relíquia: Cinema Paradiso na Serra

Colecionador reconstrói Metro Tijuca na cidade de Conservatória

As luzes se apagam lentamente, a cortina verde se abre e o rugido do leão anuncia: a sessão vai começar. O barulho do projetor antigo não chega a atrapalhar a voz suave de Judy Garland em O Mágico de Oz, o filme da noite. O espectador tem a sensação de ter entrado num túnel do tempo: o Centímetro Conservatória é uma réplica perfeita do Metro Tijuca, demolido em 1977 para se tornar uma loja de departamentos. Inaugurada em agosto, a reprodução, de 60 lugares, é a realização do sonho do advogado Ivo Junior, 60 anos, um apaixonado pelas salas de cinema clássicas. Ivo escolheu a pacata cidade de Conservatória, no Sul Fluminense, para construir o último exemplar existente de um cinema Metro.

Todos os detalhes remetem à época de ouro da produtora Metro Goldwin Meyer (MGM): a arquitetura art déco, os objetos originais, o frio exagerado do ar-condicionado. Entre as décadas de 40 e 70, os suntuosos cinemas da Metro eram programa obrigatório dos cariocas nos fins de semana.

- Não esqueço a sessão de E o vento levou… que fui assistir diversas vezes, aos 16 anos. Estou impressionada, é tudo exatamente igual àquela época – conta a aposentada Vitória Marques, 79 anos, depois de assistir à sessão do Centímetro.

- Quando criança, eu ia ao Metro Tijuca com meus pais, todos os domingos, às 10h. Era mais sagrado do que ir à missa. Colocávamos as melhores roupas e assistíamos aos desenhos do Tom & Jerry. No final, ganhávamos um bombom. Aqui, tudo é idêntico, até os cinzeiros – emociona-se o médico Juarez Figueiredo, 58 anos, apontando para o móvel de madeira na entrada.

O que sobrou dos cinemas Metro Passeio, Boa Vista, Copacabana e Tijuca foi garimpado pelo advogado quando os prédios foram demolidos para dar lugar a igrejas evangélicas, supermercados e lojas de roupas. Assim, Ivo encontrou os painéis em madeira onde eram exibidos os cartazes dos filmes na calçada. Também as roletas, as placas sinalizadoras de entrada e saída e a urna de vidro em que os espectadores depositavam os ingressos – esta Ivo achou ainda com os tíquetes dentro. As luminárias foram encontradas num ferro-velho, e os projetores, obsoletos, doados pelo então proprietário das salas, Luiz Severiano Ribeiro.

A história do advogado se confunde com o enredo do filme Cinema Paradiso, dirigido por Giuseppe Tornatore em 1988. Ainda menino, Ivo preferia acompanhar os filmes ao lado do operador, no Cinema Santo Afonso, na Tijuca, em vez de assistir com os amigos, nas poltronas. O hábito se tornou uma paixão e, desde então, Ivo coleciona tudo o que se refere aos filmes e cinemas da MGM.

- O Centímetro vai ser mais do que um museu da Metro. Quero trazer estudantes de cinema para fazer workshops aqui. Quem não tem onde exibir suas produções também terá espaço, e o próximo festival de cinema de Búzios será fracionado aqui – revela Ivo.

A escolha da cidade não foi casual. Ivo quis aliar o cinema à tradição cultural da Capital das Serestas, como é conhecida a pacata cidade de cinco mil habitantes. Como tinha um terreno em Conservatória, aproveitou o espaço para erguer o prédio. A casa foi crescendo ao redor e, para entrar no Centímetro, os visitantes estranham a passagem pelo quintal do advogado.

- Pus o Gene Kelly logo na entrada, orientando os turistas – brinca Ivo, em frente ao painel com os astros dos musicais da MGM.

Durante a exibição para os visitantes – o cinema ainda não oferece sessões regulares, é preciso marcar com antecedência – tem pipoca com pipoqueiro, música na sala de espera, e até o ingresso é uma réplica dos originais. Ele mesmo faz questão de operar os projetores. No meio da sessão, sempre com filmes clássicos, um intervalo para a troca do rolo. Ivo completa:

- Se depender de mim, a história desses palácios não vai ter o famoso ”The End” .

Texto e imagem reproduzidos do site: revistamoviola.com

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