Ator e diretor, o 'Rei da Pornochanchada' Carlo
Mossy participa do documentário
Ex-gerente do Cine Santa Rosa, Zé Grande relembra o convívio
que teve com o ator e diretor Mazzaropi
Pesquisadora dos cinemas de rua, Talitha Ferraz fala da comoção popular
com o fechamento do Cine Olinda. (Fotos: Divulgação).
Publicado originalmente no site da FAPERJ, em 23/06/2016.
Documentário resgata histórias vivenciadas nos cinemas de
rua
Qualquer semelhança, não é mera coincidência. É o que
confidencia o professor do Curso de Produção Cultural do Instituto Federal de
Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IFRJ), campus Nilópolis,
Tiago José Lemos Monteiro. Bebendo na produção de um dos maiores cineastas e
documentaristas brasileiros, Eduardo Coutinho (1933-2014), o pesquisador
produziu um vídeo-documentário sobre as relações de personagens anônimos e
famosos com o ambiente dos cinemas de rua do Rio de Janeiro e o fascínio
despertado pela imagem em movimento na telona.
O set de filmagens é uma das salas do Cine Center, em Nova
Iguaçu, na Baixada Fluminense, já desativado. No elenco, estudiosos dos cinemas
de rua do Rio, estudantes, espectadores, profissionais que trabalharam em
antigas salas de exibição, personalidades que viveram os tempos áureos da
produção cinematográfica brasileira e, até mesmo, atores, que interpretam
histórias fictícias.
Memórias vividas, criadas e interpretadas se combinam na
reconstrução do imaginário que envolve os cinemas de rua neste documentário do
professor do IFRJ – da mesma forma como Eduardo Coutinho fez em seu "Jogo
de Cena" (2007), longa que mistura realidade e dramaturgia, onde os
personagens reais falam da sua própria vida e, depois, atrizes interpretam as
personagens. Um jogo em que o espectador não sabe o que é real e o que é
ficção.
"Sempre me consternou o fato de os cinemas de rua terem
sido extintos e dado lugar a outros empreendimentos, como farmácias e igrejas.
Visitar e revisitar esses lugares, pautava meu interesse", conta Tiago,
que, em 2011, obteve apoio da FAPERJ, por meio do edital Apoio à Produção e
Divulgação das Artes no Estado do Rio de Janeiro – 2011, para desenvolver seu
projeto.
O pesquisador ressalta que, inicialmente, a ideia era fazer
uma pesquisa histórica sobre os cinemas da Baixada Fluminense. No entanto, a
escassez de fontes documentais levou a uma mudança de rumo do projeto. Diante
desse desafio, Tiago optou por aliar o interesse de contar a história dos
cinemas à sua atividade como professor responsável pelo Núcleo de Criação
Audiovisual do IFRJ – Nuca. Para realizar a tarefa, ele contou com a ajuda de
10 colaboradores, entre pesquisadores, monitores, bolsistas e voluntários.
"Eu tinha essa vontade de criar uma produção de cunho
historiográfico com um viés mais memorialista das pessoas com as salas de
cinema de rua. Pensar a realidade dos bairros de subúrbio e da Baixada, que
tinham no cinema uma opção de lazer popular e barata", diz Tiago.
Depois de muita pesquisa, o professor do IFRJ e sua equipe
conseguiram encontrar um set de filmagens que se adequasse, perfeitamente, à
ideia do projeto: o Cine Center, em Nova Iguaçu. Preservando o estilo de
cineteatro, que remonta à década de 1970, a sala mantinha elementos de época,
tais como as cadeiras em madeira, os letreiros manuais e em cor vermelha, a
telona e o antigo projetor. Foi nesse espaço que o documentário batizado de
"Tempo de Projeção", ainda inédito, foi rodado. Com 79 minutos, o
filme apresenta ricos depoimentos do ator e diretor, conhecido como "Rei
da Pornochanchada", Carlo Mossy; e do ex-gerente do Cine Santa Rosa, de
Duque de Caxias, Zé Grande.
No filme, Zé Grande relembra o convívio que teve com o ator
e diretor Amácio Mazzaropi (1912-1981), que imortalizou a figura do jeca, e
também discute as dificuldades que levaram ao desaparecimento das salas de rua:
"O custo de exibição do filme de película de 35 milímetros é de R$ 4 mil.
Já o filme digital custa de R$ 300 a R$ 400", diz.
O depoimento de Carlo Mossy reforça o debate. Para ele, é
importante que os cinemas de rua voltem a funcionar. "Eles deveriam exibir
60% de filmes brasileiros e 40% de 'filmes alienígenas'. O grande público não
vai ao cinema de shopping porque não tem condições monetárias. As pessoas
gostariam de ir a pé e voltar a pé do cinema", diz Mossy, que, em outra
passagem do filme, revela toda a emoção que tem com essa arte: "A projeção
não era apenas de fotogramas. Era de emoções, paixões e momentos
inesquecíveis".
Fundador e diretor do Cinema Ponto Cine – primeira sala
popular de cinema totalmente digital do País –, Adailton Medeiros também
ressalta, no documentário, a função social dos cinemas de rua. "Só 17,2%
dos cariocas já pisaram em um cinema. Ele vive mais no nosso imaginário do que
na nossa prática. Temos 2.500 salas no Brasil. É muito pouco para os mais de
190 milhões de brasileiros", questiona.
Professora e pesquisadora dos cinemas de rua, Talitha Ferraz
também participa do documentário. Ela ressalta como as salas de cinema
modificaram os espaços urbanos e o cotidiano da população, a partir da década
de 1940. "Eu era moradora da Tijuca e vi os fechamentos dos cinemas de rua
acontecerem. Claro que eu não peguei o fechamento do Cine Olinda, que foi o
maior cinema da América Latina, mas o relato das pessoas que viram a demolição
dá conta da grande comoção que ocorreu. Muitos foram para a porta do cinema
para protestar, chorar e lamentar a sua demolição. Foi uma grande perda",
afirma Talitha no documentário, referindo-se ao cinema que foi demolido para
dar lugar a um centro comercial, o Shopping 45, localizado na Praça Saens Peña.
O filme de Tiago também compartilha histórias pessoais e
análises da professora, pesquisadora e artista Paola Barreto; da jornalista
Paula Dias; do jornalista e professor Rodrigo Cerqueira; do ex-funcionário do
Cine Jóia, em Copacabana, Pedro Soares; do economista e estudante de Produção
Cultural, Carlos Abrunhosa, do estudante
Rafael Velloso e dos atores Ana Moura e Gueko Hiller. Como parte da estética
adotada pelo diretor, o público não consegue identificar os participantes, que
não são identificados durante o documentário, mas apenas nos créditos finais.
Finalizado em 2014, o documentário ainda se encontra
inédito, disponível apenas em um canal particular no Youtube. Segundo Tiago,
problemas técnicos comprometeram a qualidade do som da produção, que deve passar
ainda por ajustes. "Contamos com uma boa estrutura de imagem, mas não de
áudio. Precisamos ainda contornar problemas na mixagem para, então, divulgar o
projeto ao público", afirma o pesquisador.
Texto e imagens reproduzidos do site: faperj.br
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